Pensei em iniciar essa mensagem com o poema de Fernando Pessoa que mais me ajudou no caminho da Arte até hoje.
Mas a partir daí tudo o que eu escrevesse ia soar raso e copiado. (hehehe..)
Por isso, vou deixa-lo para o final.
Quero expressar minha profunda convicção da possibilidade de reverência à figura do Cristo Redentor de acordo com as crenças Wiccans.
Mais ainda, correndo o risco de soar extremamente antipático, gostaria de dizer que considero ingênua a opinião de que misturar panteões de civilizações tão diversas quanto a mesopotâmica, a egípcia e a hindu, e ao mesmo tempo excluir imagens do rico imaginário cristão seja coerente. Não pode ser coerente. Ao relacionarmos deidades dos caiapós e dos celtas, inevitavelmente desprezamos certos detalhes importantes de cada grupo específico em prol de um objetivo que vise realçar as semelhanças. Por que a imagem do Cristo não pode ser aproveitada em nossos ritos, então, a despeito do uso odioso a que tem sido submetida por outros?
Está mais do que claro pra mim, portanto, que não devemos nos permitir desvalorizar imagens arquetípicas poderosas por estarem elas associadas a momentos de vergonha da história humana. Os sacerdotes que fizeram tal uso dessas poderosas ferramentas e seus argumentos já não nos dizem respeito! Misturemos, sim, os panteões, e sem exceções, portanto!
Não vejo porque a leitura do Mabinogion seja de maior validade que a da Bíblia, por exemplo.
Por isso, reverencio o Cristo Redentor, o Messias Crucificado como uma das tantas faces do grande deus pai. É aquele cuja voz foi silenciada, porque trazia a luz onde a escuridão era forçada; aquele que aceitou carregar sua cruz por pecados que não existiam; aquele que aceitou sentir toda a dor da humanidade em sua carne e fez de seu sangue sagrado; aquele que se chamou filho de deus, e deus ao mesmo tempo, e não foi compreendido; talvez um dos maiores bruxos já conhecidos.
Que gritemos, então, aos quatro ventos que SOMOS BRUXOS, mas na hora em que formos cobrados, que tenhamos tido antes a iniciativa de levar nossas idéias às ÚLTIMAS CONSEQUÊNCIAS, de modificação de valores e pensamentos profundamente incrustados em nossa alma há tanto tempo! Ou vamos andar mancos apoiados em frases um dia poderosas, hoje transformadas em medíocres clichês?
Faço, então, um apelo: não se neguem a responder! Esta talvez seja a maior das batalhas, talvez a única válida, dentre todas: a que lutamos contra nós mesmos! Corram o risco! Questionem-se! Ponham suas convicções mais íntimas em dúvida! EXPONHAM-SE A SI MESMOS, é um exercício dificílimo, que, creio, vale a pena. |
Encerro com poema de Ricardo Reis, heterônimo de Fernando Pessoa. É um poema belíssimo. Fernando Pessoa esteve em algumas reuniões com Aleister Crowley; ele mesmo era pagão e muito interessado pelos assuntos ocultos (há outros poemas de tema claramente ocultistas, e alguns muito mais abertamente que estes; como exemplo, posso citar “O Último Sortilégio” – este assinado pelo próprio pessoa – , em que uma sacerdotisa conversa com a deusa a respeito da perda progressiva de seus poderes mágicos).
Não a Ti, Cristo
Não a ti, Cristo, odeio ou te não quero.
Em ti, como nos outros, creio deuses mais velhos.
Só te tenho por não mais nem menos
Do que eles, mas mais novo apenas.
Odeio-os sim, e a esses com calma aborreço,
Que te querem acima dos outros teus iguais deuses.
Quero-te onde tu estás, nem mais alto
Nem mais baixo que eles, tu apenas.
Deus triste, preciso talvez porque nenhum havia
Como tu, um a mais no Panteão e no culto,
Nada mais, nem mais alto nem mais puro
Porque para tudo havia deuses, menos tu.
Cura tu, idólatra exclusivo de Cristo, que a vida
É múltipla e todos os dias são diferentes dos outros,
E só sendo múltiplos como eles
Estaremos com a verdade e sós.