Uma visão geral da wicca por uma mulher bruxa.

1489[1]Escrever sobre bruxaria é sempre um desafio. Ela representa um universo imenso, cheio de pequenas estrelas, e seria injustiça não cobrir todas elas. Colocar o que é esta religião (para uns) e filosofia (para outros) que atrai tantas pessoas; quem são esses Deuses que são tudo… No entanto, com espaço limitado, está aqui uma abordagem aos aspectos mais importantes (?). Em futuras oportunidades, falaremos sobre diferentes tradições, mitologias, panteões, liturgias, ou seja, cobrindo todas as brilhantes estrelinhas.

Origens da Espiritualização

O fazer mágico e de harmonia com a Natureza, que é corrente para os bruxos, vem de tempos antigos, nos quais os homens se entendiam como parte da Criação. Desde o tempo do Neanderthal observamos a espiritualização do homem: em parte como tentativa de compreender e sobreviver no mundo.

Observa-se a sacralidade das cavernas e dos animais como deuses, ancestrais, guias e protetores. Com o passar do tempo, a figura humana passa a integrar ritos, sob as figuras dos xamãs e das Vênus.

Os xamãs são desenhados nas paredes das cavernas representando o poder mágico humano e animal, chegando às esferas do divino. Já as Vênus são esculturas que representam o poder fértil e nutridor da mulher; até então, não se entendia plenamente o mecanismo feminino x masculino da Natureza.

Magia Primitiva

Juntamente com as manifestações já colocadas, os antigos faziam magia através de rituais ou do seu dia-a-dia.

Na pré-história era indispensável que os animais estivessem ao alcance da lança dos caçadores ou que, mais tarde, os campos agrícolas estivessem verdejantes. Desenvolveu-se entre esses homens o que Frazer (1889) chama de “magia imitativa”. Rituais, pinturas, atos, feitiços, festas e manifestações diversas eram feitas imitando a caça, os animais ou a fertilidade da Terra. Para eles o efeito era semelhante à sua causa, e esta “lei mágica” perdura até hoje.

Outra forma de manifestação mágica era (e ainda é) a magia por contágio, ou seja, na qual um elemento influência outro através do contato. Daí nasceram tradições de maldições e benefícios usando roupas ou cabelos, unhas e objetos pertencentes a alguém.

Até aqui, alguns se perguntam, então a bruxaria é pré-histórica? Talvez não ela per se, mas com certeza seu embrião de crenças e práticas.

Funções em Grupos e Praticantes Solitários

O tempo passa e as sociedades se desenvolvem. Junto com elas, suas práticas e crenças. E assim, cada grupo foi construindo suas formas de se ligar ao divino e a forma de concebê-lo. Desta forma, nasceram e criaram-se os clãs, famílias com crenças próprias de cada um; tribos; grupos e praticantes das ciências da Natureza como parteiras, herbários, boticários, xamãs que cuidavam do bem-estar de uma comunidade. Foram eles os precurssores das ciências naturais e ocultas.

Cada sociedade passou a ter um sistema. Os celtas tinham como sacerdotes e sacerdotisas os druidas. Adoravam deuses e deusas, tinham heróis e sua mitologia mostrava uma gama de objetos mágicos. Tinham uma roda óctupla de festas, destacando o Samhain que marcava o ano novo. Eram um povo guerreiro e desenvolvido e aplicavam a igualdade entre sexos. Segundo Aengus (3), na verdade não existem provas concretas para indicar uma celebração propriamente dita dos solstícios e equinócios entre os celtas da Idade do Ferro (período em que os druidas estavam ainda “em vigor”) – este inclusive é um assunto ainda polêmico, mas basicamente quem trouxe à luz essa idéia do ano octuplo entre os druidas foram as primeiras ordens druídicas inglesas do século XVIII (tais como a OBOD) as quais são conhecidas por seu druidismo romântico, carregando influências maçônicas (como era de se esperar para a época).

Os ciganos, possivelmente originários da Índia, ainda são um povo nômade que adota o sistema religioso do lugar no qual se encontram. Têm uma vasta tradição em divinação, feitiços de amor e fidelidade tal qual, maldições.

Os itálicos, descendentes de vários povos, tinham diferentes panteões. No cerne dos romanos, seus ritos se destacavam pela devoção à terra cultivada e aos deuses urbanos; já os etruscos apresentavam um refinado culto aos mortos e às fadas.
Todos esses povos influenciaram a bruxaria e se influenciaram entre eles mesmos. Durante a idade antiga houve muito intercâmbio de informações e liturgias – principalmente via romanos – vistas até hoje.

Estes povos, entre muitos outros da antiguidade prosperam com suas formas e caminhos até a ascensão da Igreja Católica e sua sede de hegemonia religiosa e controle político. Então, chega a Idade das Trevas na qual fenecem as Artes, a cultura clássica, as ciências e muitos dos que conheciam os segredos da Natureza.

Bruxaria Hoje

A Bruxaria sempre esteve presente, mais ou menos exposta. Em 1951 foi revogado o último embargo legal à Bruxaria na Inglaterra, gerando publicações e a sua popularização, principalmente na forma da Wicca.

No entanto, a Bruxaria não existe de uma maneira somente e ao longo do tempo sofreu influências de sua região e dos contatos desta. Frater Aleph (1) nos coloca que houve uma certa hermetização e aplicação de conceitos de ordens iniciáticas como a Golden Dawn e a Ordo Templi Orientis. A primeira trouxe, essencialmente, elementos como a evocação dos elementos da Natureza e suas correspondências, o chamado aos Guardiões e a construção do círculo mágico. A segunda, a influência da Lei: ‘Faz o que tu queres, pois é tudo da Lei’, sendo alterada pedindo que não se prejudique ninguém. Sem dúvidas, esta é uma questão controversa e que gera diversas discussões sob a legitimidade ou não desses “toques” herméticos.

Como eu já coloquei, a Bruxaria é uma bela e ampla árvore que tem diversos galhos e estes, seus ramos. Trago então alguns de seus galhos. No fim do texto, estão os contatos das pessoas mencionadas.

Ásatrú

O Ásatrú é uma religião como a Bruxaria e suas reconstruções neopagãs. É chamada de velha religião do norte germânico e escandinavo da Europa, e vem se mantendo dentro das tradições. O interesse daqueles que descendem dos predecessores desta religião é de mantê-la como os antigos a conceberam. A palavra “Ásatrú” vem do islandês que segundo traduções do dinamarquês significava a crença nos Deuses do Aesir. As origens da religião estão perdidas na antiguidade. No seu cume, esta cobriu todo o Norte da Europa. Em 1000 CE, A Islândia se tornou a antepenúltima cultura Nórdica a se converter ao Cristianismo. Suas motivações prioritárias foram econômicas. A Suécia foi governada por um rei Pagão até 1085 CE.

Quem se dedica a esta religião tem, fundamentalmente, as seguintes crenças:
– Aesir: são os Deuses de uma família, clã, grupo, tribo, etc.
– Vanir: são os Deuses da fertilidade e forças da Natureza.
– Jotnar: são Deuses, também conhecidos como gigantes, representando o caos.
– Os Nove Nobres Valores: “coragem, verdade, honra, fidelidade, disciplina, hospitalidade, trabalho, independência e perseverança”. Além disso, despem-se de preconceitos contra os diferentes e são grandes devotos de suas famílias e ancestralidades (4).

Bruxaria Natural

A Bruxaria Natural é entendida por quem a pratica como uma filosofia de vida e não uma religião. Ser bruxa segundo esses preceitos é conhecer a Natureza e tudo que ela nos oferece reverenciando o divino da forma que lhe parecer mais correta, ou seja, o praticante pode ser uma bruxa católica, espírita, budista, etc. Geralmente trabalham muito bem com herbalismo, cozinha e remédios naturais, além de terapias alternativas e divinação. Podemos encontrar pessoas que trabalham com este conceito de bruxaria como a Tânia Gori, proprietária da Universidade Holística Casa de Bruxa, onde ministra cursos e rituais para quem deseja conhecer a Bruxaria Natural (5).

Bruxaria Tradicional

A Bruxaria Tradicional remonta as práticas feitas pelos grupos de uma determinada regionalidade, notavelmente na Grã Bretanha e na Irlanda. Eles acreditam na sacralidade da Terra e no compromisso das pessoas com a sua sobrevivência. Acreditam num panteão de Deuses que representam as forças da Natureza e trabalham junto com eles. Geralmente estão desagregados dos elementos herméticos e cerimoniais presentes em algumas religiões neopagãs como círculos mágicos e indumentárias rituais. Alguns grupos ainda não acreditam em uma religião per se, pois nunca se sentiram desligados do divino; acreditam basicamente na força e conexão deles com o lugar onde vivem. Existem alguns poucos grupos e praticantes desse tipo de Bruxaria Tradicional, um deles no Rio de Janeiro, sob coordenação do Aengus (3).

Stregheria

A Stregheria ou Bruxaria Italiana é um dos vários ramos da bruxaria. Esta se remonta aos tempos antigos da península itálica e seus vários povos: etruscos, romanos, latinos, etc. além das influências recebidas de ciganos, celtas. A bruxaria italiana tem uma gama extremamente grande de tradições, práticas e crenças, pois ela se desenvolve dentro de famílias e por hereditariedade, porém existam grupos e tradições que aceitam pessoas de fora. Existe também dentro desta, um sincretismo com a religião católica, ou seja, bruxas que praticam magia e durante essas rezam a Jesus e Maria. Na verdade, a pluralidade é tão larga que fatalmente algum aspecto seria deixado de fora. Em base, no entanto podemos encontrar as crenças na Deusa Diana e Apollo, Lúcifer, Virbios ou Dianus (dependendo da região), uma grande dedicação à natureza e seu equilíbrio, rituais e valorização da ancestralidade e hereditariedade, ritos às mudanças da Natureza, uma vez que elas proporcionam o sustento das pessoas e são os reflexos deles mesmos. As tradições mais famosas são a Tríade: Tanarra, Fanarra e Janarra; e a tradição Aridiana, fundada por Raven Grimassi e o Clã Umbrea. No Brasil, existem alguns praticantes, principalmente hereditários ou “escolhidos”, porém é difícil encontrar um grupo que pratique. Eu trabalho com essa parte da bruxaria, para contato meu endereço eletrônico está no fim do texto.

Wicca

A Wicca é um dos maiores expoentes do neopaganismo. Inclusive é motivo de confusões entre ela e a bruxaria per se. A palavra wicca varia do inglês antigo “wicce”, palavra de raiz anglo-saxã, que significa moldar ou as pessoas que moldam suas vidas, também valendo como pessoa sábia. Ela foi adota pelos pais da bruxaria moderna, Gerald Gardner e Doreen Valiente a partir da década de 1950. Acredito que a Wicca seja hoje a religião dentro do neopaganismo que tenha mais seguidores no Brasil. Em todo mundo, ela abriga várias tradições com clãs, grupos, covens, famílias e praticantes solitários. As crenças e práticas da Wicca podem mudar um pouco de acordo com cada praticante, mas seu conceito básico continua o mesmo: “Sem prejudicar ninguém , faça a sua vontade”. Outra parte importante da crença wiccana é a “Lei Tríplice” que afirma que todos os atos terão uma contrapartida vezes três. Além disso, existe a adoração à Deusa e seu consorte, dentro de círculos mágicos; festas para as luas cheias e uma roda óctupla que saúda a Natureza em seus aspectos de vida-morte-renascimento.

Existem muitos covens no Brasil, mas para poder fazer parte deles demanda tempo, estudo e boa-vontade: tanto do aspirante quanto dos sacerdotes. Porém para que estudos possam ser conduzidos existem grupos especiais que auxiliam os buscadores, este é o caso do Água da Lua, coordenado pelo MillenniuM (2). Existem também grupos independentes que fazem seus estudos e rituais de acordo com suas necessidades.

Concluindo

Finalmente, existem muitas verdades da Bruxaria e suas muitas vertentes. Essas são criadas dia após dia, lua após lua pelos seus praticantes e estudiosos. Muitos trabalham sob diferentes perspectivas e os desenvolvem com grande competência. Como disse um amigo, hoje precisamos de gente que se unam pelas igualdades e não se dividam pelas diferenças. Queremos bruxos de todos os ramos que sejam críticos e reflexivos, pois creio que estamos já cheios de repetidores de versos. O poder e a alegria estão em sermos capazes de alterar a realidade. Então que ela seja refeita todos os dias por pessoas compromissadas. O livro mais sagrado dos Deuses está aberto para todos, dia e noite: toda a Criação, toda a Natureza e nós mesmos. Harmonia e equilíbrio para quem busca.

imageSBOPietra di Chiaro Luna
                Agradecimentos:
1. Frater Aleph, pelos esclarecimentos sobre as ordens de Thelema e Golden Dawn, 
além do carinho e paciência.2. MillenniuM, sacerdote wiccano e o Projeto da Água da Lua.3. Aengus, pelas informações e pitacos sobre bruxaria tradicional.4. Gwydyon Drake, pela ajuda na questão mitológica e por todo apoio.

5. Universidade Holística Casa de Bruxa, em Santo André, SP.

                                                                                               Lux!

filipeta
imags
DORADA25255FBARRA25252DGAMA2-1