Por: Bety Romero

 
.O que aconteceu durante muito tempo na Casa dos Jesuítas, em São Vicente, foi um mistério para os habitantes da capitania. O azeite: que serviam para alimentação e também a iluminação das lamparinas estava em falta na colônia. Isso, porém, não foi problema para os jesuítas. Quando comunicado pelo irmão despenseiro de que não havia mais uma só gota de azeite no barril, o padre superior mandou que não o removesse, pois “Deus haveria de provê lo”. No dia seguinte, o despenseiro descobriu que havia azeite no barril. Novamente à noite este já acabara, mas de manhã, novamente, lá estava o azeite.

Isso durou cerca de um ano, e para os populares era algo incompreensível: como os jesuítas conseguiam o azeite a ainda o distribuíam, quando mais ninguém o tinha na capitania? Um mistério para todos, menos para os irmãos da Casa dos Jesuítas. Para eles estava claro que aquilo era apenas mais um milagre de seu superior, o padre José de Anchieta.
 

Trata se apenas de um dos inúmeros milagres atribuídos ao padre Anchieta, beatificado em 1980. Filho de nobres, nascido nas ilhas Canárias em 1534, permaneceu no Brasil, entre os índios, 47 de seus 63 anos vividos, durante os quais realizou uma série de feitos, entre curas milagrosas a outros fenômenos parapsicológicos. Proezas que até hoje permanecem apenas parcialmente explicadas, seja pela medicina, pela Igreja ou pela própria parapsicologia.

Na opinião do padre Quevedo, 49 anos, autor do livro A Face Oculta da Mente, pertencente à ordem dos jesuítas   a mesma do beato Anchieta   e conhecido estudioso da parapsicologia, José de Anchieta é, antes de tudo, uma fonte inesgotável de estudos, pois sua vida foi uma constante de fenômenos parapsíquicos que transcendem a compreensão da ciência e da própria Igreja: “Dos feitos do padre Anchieta”, diz Quevedo, “cerca de 30 foram relacionados, testemunhados sob juramento, documentados a anexados ao seu processo de beatificação, e, dentre eles, o mais comum era a levitação. Através do testemunho de varias pessoas contemporâneas de Anchieta, sabe se que a levitação do beato era um fato corriqueiro quase não despertando sustos na população. Era comum ele reza missas levitando.”

Levitar, entretanto, não era algo comum entre os índios. Alias, foi essa proeza, que uma vez o salvou dos perigosos tamoios, quando foi feito refém em Iperoig (onde hoje é Ubatuba), enquanto o padre Nóbrega tentava um pacto com os tupis. O chefe dos tamoios, Pindobuçu, vendo o elevar se do chão, atemorizou se e, na dúvida sobre que espíritos, bons ou maus, estariam dando lhe forças para tal, preferiu não arriscar, poupando lhe a vida.
 

Segundo padre Quevedo, a Igreja não considerava a levitação um milagre, uma vez que ela é um fenômeno natural. Salienta que, no entender da parapsicologia, a levitação é perfeitamente explicável. No caso do padre Anchieta, entretanto, é explicável apenas isoladamente; na continuidade, não. 

Sabe se que a fonte de todo fenômeno parapsicológico é a energia corporal, dirigida pelo inconsciente. A levitação pode ser provocada por uma emoção tão forte, transformando essa tele-energia de forma a permitir a elevação do corpo acima do solo. No caso do beato Anchieta, porém, a única explicação plausível seria a dessa energia corporal, dirigida pelo inconsciente desejo de elevar se a Deus, que o faria levitar. Porém, nisso há uma contradição. A levitação antigamente era tida como milagre, se ocorrida com alguém diretamente ligado à religião, e considerada como obra do diabo, quando ocorria com um leigo. Os fenômenos só acontecem sob transe, após o qual há o desgaste, o cansaço devido à força despendida no transe, e na sequência incorrem para uma vida mais curta dos dotados de faculdades para-psíquicas, que por toda essa energia gasta nos transes acabam morrendo cedo. 

Nada disso, entretanto, ocorria com Anchieta. Apesar de fraco além de um sério problema na coluna, que o obrigava a andar curvado, tinha saúde tão débil que praticamente veio para o Brasil para morrer. Ele viveu aqui 47 dos seus 63 anos, levando sempre uma vida regrada, tranqüila, sendo dotado de um espírito sereno e equilibrado mental e emocionalmente. Na verdade, ele levitava fora de transe, ou seja, dominava as forças da natureza como Cristo…

Na opinião do parapsicólogo, há uma grande semelhança entre a vida e os feitos do beato Anchieta com a vida e os feitos de Jesus Cristo. De acordo com sua tese, na Bíblia podemos encontrar dois tipos de milagres. Um que poderíamos considerar milagre, realmente, por ser inexplicável, a outro relativo, que poderia ser analisado à luz da parapsicologia:
 

“Cristo”, prossegue o padre “fez vários milagres que a parapsicologia não explica, como a sua própria ressurreição. Além de reviver, e subir aos céus (levitar), há outro fenômeno nessa ressurreição e que só hoje podemos entender. Segundo o Evangelho de São João, o lençol que o envolvia estava ‘aplainado’, ou seja, ele ressuscitou e saiu do túmulo sem que o lençol que o envolvia fosse desenrolado, sequer tocado, segundo conclusões a que se chegou recentemente, a partir de pesquisas realizadas com o tal lençol. Mas Cristo também fez outros milagres, que hoje seriam explicáveis pela parapsicologia. O primeiro deles é a cura de pessoas, que pode ser conseguida através da fé do próprio amilagrado, ou ainda a levitação, a sua passagem sobre as águas. No entanto, como já foi observado antes, todo fenômeno parapsíquico pressupõe o desequilíbrio emocional, o transe e o posterior desgaste. Mas isso não ocorria com Cristo. No conjunto, ele usava desses poderes quando e como queria, era dono das forças da natureza.”

É nesse ponto que Oscar Quevedo vê a semelhança entre o beato a Jesus Cristo. “Ele ressuscitou mortos   sabe se de seis pessoas revisitadas pelo padre Anchieta embora fugisse disso alegando sempre: ‘Não vim como medico’. Curou doentes, levitava, tinha poderes de premonição, poder hipnótico, telepatia, psicofonia, pantoamnésia, fotogênese e poder de transformação   ou seja, no conjunto, como Cristo, ele também dominava as forças da natureza, conseguindo esses fenômenos quando e como queria, e sem estar em transe. Digamos que ele conseguia de Deus o dom de usar esses poderes de acordo com sua vontade.”

Apesar dos inúmeros feitos, em vida, do beato Anchieta, a Igreja mantém uma posição bastante rígida, quase cética, quanto a eles; segundo o direito canônico, não existe milagre em vida, somente após a morte. Dessa forma, a Igreja não se manifesta sobre a obra de Jose de Anchieta em vida, nem aceita que houvesse realizado em vida qualquer milagre.

 

Padre Quevedo explica que é natural que haja um certo exagero nos feitos do beato, acrescentado pela história. E cita este exemplo: certa ocasião, o beato navegava pelo rio Tietê quando seu barco naufragou. Diz a história que o barqueiro que o conduzia, após vários mergulhos, encontrou o no fundo da água, calmo, sentado e lendo o catecismo; “O que aconteceu, realmente, fica difícil de dizer. Presumo que tenha havido uma salvação milagrosa do padre em não se afogar, embora essa passagem esteja relatada na biografia, escrita por Pero Rodrigues, contemporâneo do beato. Rodrigues diz que ele ficou submerso coisa de meia hora.”

Quevedo prossegue: “Sabe se que o fenômeno da psicofonia ocorreu a Anchieta quando este se encontrava em Bertioga. Várias pessoas ouviram sua voz, em pregação, num momento em que ele estava a várias dezenas de quilômetros distante do local. A fotogênese   produção de intensa luz repentina   foi presenciada por muitos fiéis durante uma missa, e chegou a assustar os que estavam na Igreja de Nossa Senhora do Itanhaém. Durante a pregação, o padre caiu de joelhos. Neste exato momento, um imenso clarão iluminou o templo.”
 

O padre Quevedo ressalta que a notável memória do padre também não pode ser esquecida. É sabido que os seres humanos considerados normais usam apenas 10% de sua capacidade mental; dai a suposição que o beato tivesse uma capacidade ou um domínio maior, pois sua memória era, simplesmente, extraordinária, o que a parapsicologia chama de pantoamnesia. 

Lembra o padre: “Anchieta era o único mestre de todas as letras no Brasil, ensinando seus próprios irmãos. Já em Coimbra, quando ainda era noviço, apesar da saúde fraca, sempre foi o aluno mais brilhante.” Quevedo afirma que há um erro por parte dos historiadores na sua biografa: pela biografia conhecida, enquanto esteve cativo dos tamoios ele escreveu nas areias da praia, por não dispor de papel a lápis, o consagrado poema à Virgem. Na verdade, ele apenas escreveu em latim, corrigindo os erros gramaticais dos 5.786 versos desse poema que fora escrito anteriormente. Agora, o fato dele saber de cor esses versos por si só já é um fenômeno. Além disso, seis meses após sua chegada ao Brasil ele publicou uma gramática da língua tupi, língua que foi aprendida, estudada e analisada nesse curto espaço de tempo, sendo que seu livro, contendo profundas análises das raízes linguísticas, é utilizado até hoje e ainda não foi superado.”
 

Um dos casos de premonição, ou adivinhação, mais conhecidos do beato, é o da falta de peixes na Bahia. Os peixes estavam cada vez mais escassos a os pescadores começavam a passar necessidade. Anchieta então chamou um deles e mostrou lhe o lugar onde deveria jogar sua rede. Num único lançamento o pescador tirou tantos peixes que não só supriu suas necessidades e as dos missionários como pode repartir a sobra entre os pobres. Segundo o parapsicólogo, esse poderia ser um fenômeno natural de adivinhação, mas o importante é que o beato o fez quando e como quis. Padre Quevedo acrescenta que em sua biografia também são inúmeros os depoimentos de pessoas que afirmam que o padre lia pensamentos, ou seja, tinha o poder da telepatia. Da mesma forma ele dominava a hipnose, e existem várias correntes que afirmam que as passagens relatadas de conversas entre o missionário e animais selvagens, como cobras e onças no cativeiro, depondo as armas do grupo de índios que pretendia executar a ele e a Nóbrega, seriam atribuídas ao seu poder hipnótico.

No século 17, o jesuíta Francisco Pires curou se repentinamente de impaludismo (malaria) após beber alguns goles de água onde havia sido mergulhada uma lasca do fêmur de Anchieta. No século 18, novo milagre: Manoel de Jesus, picado por uma cobra no calcanhar e já com os tendões e, músculos atrofiados, e perna gangrenando, deitou se sobre a lápide do túmulo de Anchieta e de lá levantou se curado.

Porém, os milagres do beato prosseguem, e hoje existem provas vivas deles. Uma dessas provas chama se Delminda Magalhães, moradora da cidade de Jundiaí. Por volta de 1950 ela estava em coma, já desenganada pelos médicos. Como seu sofrimento se prolongasse, um de seus filhos foi ate o Pátio do Colégio, onde está uma das relíquias do beato, a pediu a bênção para que ela morresse em paz. Ela não morreu. Levantou se, curada, na mesma hora. Maria Célia Borges, também viva e morando em Salvador, em 1970 anos teve câncer nas mamas, sendo submetida a uma operação onde foram extraídos os seios. O câncer, porém, estava tão difundido que não havia cicatrização. O problema se arrastou por meses, sem que os vários médicos pudessem solucioná-lo, ate que ela rezou, evocando o padre Anchieta. Quinze dias depois, estava curada.
 

O mais contundente desses casos é o de Dante André Manacorda, paulista, com 52 anos, um alto funcionário de uma indústria em São José dos Campos. Ele conta que estava com câncer, que havia se iniciado nos órgãos genitais há 13 anos, alastrando se pelo corpo a atingindo principalmente os pulmões. Dante era ateu, e há vários meses vinha se tratando no Hospital do Câncer, em São Paulo, mas sem progressos. Já desenganado quanto à morte próxima e dolorosa, e quase sem conseguir andar, na terça feira, 4 de novembro de 1967, ele foi ate o Pátio do Colégio, onde recebeu uma bênção e tocou o osso do padre Anchieta. Na sexta-feira anterior ele estivera no hospital e mais uma vez fora radiografado, com resultados que confirmavam a gravidade de seu estado. Na sexta-feira subsequente, voltou ao hospital para novas radiografias e para, provavelmente, internar-se em definitivo. Só que os resultados dessas novas radiografias o apontavam como são. Outras radiografias foram feitas, confirmando sua cura. Para o próprio Dante foi difícil acreditar, como ele conta: “Para quem está preparado para morrer, é difícil acreditar uma salvação repentina, ainda mais para mim, que era ateu.” Uma das radiografias está no Vaticano.

A beatificação de Anchieta, apesar de não terem sido provados os dois milagres após a morte, foi conseguida 400 anos após o seu processo de beatificação ter sido iniciado, uma vez que seus milagres “gozam de grande fama”.

Para um candidato chegar a venerável, primeiro é obrigatório estágio para a beatificação e canonização, os caminhos são difíceis e começam com um processo a cargo do bispo da diocese em que vivia. Nessa primeira fase o bispo ouve testemunhos, mas sem a preocupação de saber se houve ou não milagres, e sim se a pessoa exerceu “as virtudes de Deus com grande heroicidade”. Se o bispo considera que o candidato cumpriu essa exigência, o processo é enviado à Roma, onde será submetido a rigoroso exame por uma comissão especial da Sagrada Congregação para a Causa de Santos. Aprovado, o processo é submetido ao julgamento do Conselho Cardinalício. Se novamente aprovado, é enviado ao papa, que dará a palavra final. Ao ser proclamado venerável, o candidato tem aberto automaticamente seu processo de beatificação.
 

Nesse segundo estágio, o da beatificação, onde a Igreja declara que essa pessoa está com Deus e é um modelo de virtude, e dá direito a culto limitado, são exigidas a comprovação de, no mínimo, dois milagres “de primeira grandeza”, depois da sua morte.
 
 

Por: Bety Romero
Revista Planeta número 100
Janeiro de 1981
filipeta
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