O NOVO VEÍCULO DE SABEDORIA
A dança cósmica da criação, transformação e destruição, nos níveis grosseiro, sutil e muito sutil, segue o ritmo cósmico fundamental e a melodia do karma, da vacuidade e do surgimento interdependente dos fenômenos.
Em minha opinião, os iogues tântricos antigos e modernos, os mahasiddhas, santos, filósofos tibetanos (gueshes) e outros Seres Sagrados que pesquisam o mundo interior e os físicos que investigam o mundo externo, independentemente uns dos outros, descobriram a verdade da vacuidade e da interdependência dos fenômenos. É claro que, da perspectiva budista, tudo isso é criado pela mente. Acreditamos que a investigação científica interna da mente sutil e da energia, realizada por muitas gerações de iogues, santos e grandes meditadores, é muito mais profunda e poderosa que a investigação científica do nível grosseiro, realizada por nossa geração atual. Entretanto, ambos parecem estar tocando a mesma realidade a partir de ângulos diferentes e em diferentes níveis.
Os cientistas estão tocando a vacuidade e o surgimento interdependente dos fenômenos do ponto de vista objetivo, no nível grosseiro, baseados nos objetos manifestos e no que pode ser registrado pelas máquinas e conceitualmente formulado pela matemática. Os mahasiddhas e grandes meditadores tocam a vacuidade diretamente, subjetivamente e sem conceitos, nos níveis sutil e muito sutil, baseados em sua experiência pessoal da dissolução de seus elementos, ventos e consciência; resultado do terem aprendido a cuidar de seus canais, ventos e gotas. Ambos estão tocando a vacuidade e o surgimento interdependente dos fenômenos utilizando as estruturas de suas próprias metodologias científicas.
• Os fenômenos físicos e mentais são vazios de existência em si mesmos, pois todos os fenômenos são projeções de nossa mente nos níveis grosseiro, sutil e muito sutil, e o criador supremo do universo fenomênico é nossa mente muito sutil de clara luz.
• Todos os fenômenos se manifestam interdependentemente e funcionam devido ao karma (a lei de causa e efeito). Podemos examinar níveis diferentes de surgimento interdependente dos fenômenos, desde o mais grosseiro (as coisas dependem de suas partes, causas e condições) até a interdependência no nível muito sutil, quando percebemos que nosso “rotular” mental dos fenômenos é o verdadeiro ato de criação que os traz à realidade.
• O macrocosmo é um reflexo do microcosmo e vice-versa.
Conforme posso entender, as idéias defendidas pelos cientistas são as seguintes:
• Nenhum fenômeno do mundo material existe de forma “concreta” substancial ou independente como normalmente aparenta. Verificando o interior dos átomos, não encontramos nada além de espaço e energia em movimento.
• Todos os fenômenos materiais estão se desintegrando e se transformando momento a momento, no nível sutil, de acordo com uma precisa lei de conservação da energia, segundo a qual a energia nunca pode ser perdida no universo e, assim, se transforma continuamente em novas formas.
• Todos os fenômenos do macrocosmo e do microcosmo são uma grande rede interdependente. O macrocosmo reflete-se no microcosmo tal como os campos eletromagnéticos de nossos corpos.
• Alguns pesquisadores da física quântica afirmam que o universo material não pode ser entendido sem uma referência à consciência humana e que, de alguma forma, a mente está ajudando a criar os fenômenos materiais.
Os cientistas estão iniciando um diálogo com os iogues budistas porque o budismo pesquisou por completo a relação mente-matéria, os níveis sutil e muito sutil de consciência e os cinco elementos. Se os cientistas tivessem acesso a esse nível sutil subjetivo e objetivo da realidade, não precisariam comunicar-se com os Lamas. Isso não significa que os cientistas precisam tornar-se budistas. Os Lamas modernos como eu desejam apenas oferecer a essência da prática e da filosofia Prajnaparamita, Pramana, Abhidharmakosha, do Tantra e outros métodos aos cientistas, para que eles os utilizem como lhes parecer mais adequado.
Sua Santidade o Dalai Lama está pedindo à geração atual de Lamas que mostrem a qualidade da investigação budista ao mundo. Hoje em dia, quase tudo já foi examinado e pesquisado. As únicas coisas interessantes que ainda não foram pesquisadas por completo são as mensagens das antigas culturas de sabedoria, como o budismo tibetano. Precisamos fazer uma ponte entre a maravilhosa pesquisa dos cientistas modernos e a maravilhosa investigação dos lamas, iogues e mahasiddhas. Eu gostaria de organizar uma série de conferências sobre isso e publicar os resultados para poder apresentar com clareza as boas novas dos cientistas e iogues ao mundo.
Não é necessário que os cientistas entendam tudo sobre o budismo ou que os budistas entendam tudo sobre a ciência. Precisamos apenas explorar conjuntamente as áreas de interesse comum e fazer uma ponte, iniciar o diálogo e a comunicação.
É natural que os cientistas, em seu trabalho de investigação da realidade, usem seus termos científicos próprios para explicar suas descobertas. Mesmo não conhecendo o significado de algumas destas palavras, é possível ter algum sentimento sobre as verdades que eles estão tentando revelar.
Precisamos sentir e entender que essas duas correntes de visão e resultados experimentais possuem a capacidade de desvelar algo da natureza fundamental do universo. Embora os cientistas do mundo interno e externo se expressem de formas diferentes, sinto que existe certamente uma relação entre suas visões de mundo e, se fosse possível sintetizá-las, isso seria de grande benefício para a sociedade, tanto em termos do desenvolvimento da ciência e da tecnologia, quanto para o desenvolvimento da paz interior e da paz no mundo.
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Bel Cesar
Bel Cesar é psicóloga clínica com formação em Musicoterapia no Instituto Orff em Salzburgo, Áustria. Pratica a psicoterapia sob a perspectiva do Budismo Tibetano. Desde 1991, dedica-se ao acompanhamento daqueles que enfrentam a morte. Em 1987, organizou a primeira visita de Lama Gangchen Rinpoche ao Brasil. Presidiu o Centro de Dharma da Paz Shi De Choe Tsog, em São Paulo, por 16 anos, tendo em 2004, tornado-se presidente honorária. Em 1996, elaborou o livro “Oráculo I Lung Ten”, editado pela Editora Gaia em 2003. Em 2001, escreveu os livros: “Viagem Interior ao Tibete” e “Morrer não se Improvisa”, também publicados pela Editora Gaia. Desde 2002, colabora com o site www.somostodosum.com na sessão Morte e luz. Neste mesmo ano, ao unir a Psicologia do Budismo Tibetano à Permacultura, em parceria com Peter Webb, passou a desenvolver atividades de Ecopsicologia no Sítio Vida de Clara Luz, em Itapevi, São Paulo. Em outubro de 2004, lançou pela Editora Gaia o “O Livro das Emoções – reflexões inspiradas na psicologia do Budismo Tibetano”.
E-mail: belcesar@ajato.com.br
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