Henrique Cornélio Agrippa Von Nettesheim
(Colônia, Alemanha 1486 – Grenoble, França, 1535)
É considerado como o fundador da filosofia oculta
e deixou a fama de “príncipe dos mágos”, título que o acompanha até hoje. Foi o grande rebelde da Renascença.
Proporções Humanas (Agrippa)
AS PROPRIEDADES GEOMÉTRICAS DE DUAS FIGURAS ILUSTRANDO AS PROPORÇÕES DO CORPO HUMANO POR HEINRICH CORNELIUS AGRIPPA
Tradução José Antonio de Souza Filardo M.´. I .´.
Símbolos foram usados pelo homem primitivo como a forma mais antiga de escrita. Com muitas ilustrações simbólicas, grande cuidado foi tomado para enfeitar, decorar e adornar o símbolo; algumas vezes para esclarecer o significado simbólico e em outras para ocultar ou ofuscar o conteúdo simbólico. Este trabalho explora dois exemplos clássicos de ilustrações simbólicas que aparecem no Livro Dois, Capítulo xxvii dos Três livros de Filosofia Oculta [i], [ii] pelo notável Alquimista do século XVI, Henry Cornelius Agrippa, intitulados “Da Proporção, Media e Harmonia do Corpo Humano”. Estes símbolos são figuras geométricas muito complexas, acompanhadas por referências obscuras a conceitos filosóficos. A exploração intentada neste trabalho enfocará especificamente as propriedades geométricas das figuras.
Figuras de Agrippa
As relações proporcionais exclusivas mostradas pelo corpo humano parecem ter sido conhecidas em tempos antigos. Vitrúvio (cerca de 30 A.C) no Livro III de seu tratado De Architecture [iii] detalhou estas proporções por escrito como segue:
“O umbigo está naturalmente posicionado no centro do corpo humano e, se em um homem deitado com sua face para cima, e suas mãos e pés estendidos, de seu umbigo como centro, um círculo pode ser descrito, ele tocará seus dedos das mãos e dos pés. Não é somente por um círculo que o corpo humano é assim circunscrito, como pode ser visto, colocando-o dentro de um quadrado. Porque se medindo dos pés até o topo da cabeça, e, então os braços totalmente estendidos, descobrimos que esta última medida é igual à primeira; de modo que linhas nos ângulos retos entre si, fechando afigura, formarão um quadrado.”
Esta descrição (cerca de 1487) foi usada por Leonardo Da Vinci para criar o famoso desenho intitulado o Homem Vitruviano.
(Figura 1) [iv] Figuras semelhantes à de Leonardo foram criadas durante um longo período (algumas antes, algumas depois) por Filósofos e Artistas, tais como Hildegard von Bingen (1098-1179), Fra Giovanni Giocondo (1435-1515), Bartolommeo Caporali (1442-1509), Cessare Cesariano (1483-1543), Francesco di Georgio (1482-1489), Robert Fludd (1617) e Eliphas Levi (1810-1875).
Agrippa, provavelmente, tinha conhecimento de muitos destes desenhos quando em 1651 ele publicou seus Três Livros de filosofia Oculta. As seis figuras publicadas por Agrippa no Livro Dois, Capítulo xxvii são, à primeira vista, bastante semelhantes ao Homem Vitruviano (a figura 2 é uma colagem destas figuras [v]). Nestas figuras, Agrippa simbolicamente sugere, fechando o home em um círculo (ele mesmo um símbolo de perfeição e infinito) sua relação (do homem) com o reino cósmico ou divino. Outra destas figuras ilustra a forma humana com os braços estendidos (semelhante ao Homem Vitruviano) encerrada em um quadrado, ilustrando a “medida de quatro quadrados” onde o home “fará uma quadratura equilateral” [vi].
Selecionei duas destas seis figuras para análise, e elas são reproduzidas abaixo como Figura 3 e Figura 4. Favor notar que embora o restante das figuras de Agrippa no Capítulo xxvii também seja imensamente interessantes, estas duas compartilham um tema simbólico comum e têm propriedades geométricas idênticas. Limitação de espaço não permite que outras figuras sejam totalmente discutidas ou ainda mais desenvolvidas, embora elas sejam rapidamente consideradas em relação às duas figuras de interesse.
Propriedades geométricas
Os conceitos geométricos representados por ambas Figura 3 e Figura 4 são essencialmente idênticos. Na realidade, a análise destas figuras é mais bem abordada tratando-as como uma única figura composta, combinando certos elementos de cada uma delas. Duas características exclusivas das figuras são especialmente notáveis. Primeiro, a posição do corpo da forma humana na Figura 3 é tal que os braços e pernas estão alinhados com a diagonal do Quadrado em que ela aparece. A posição do corpo da forma na Figura 4, por outro lado, está alinhada com a dimensão da altura do quadrado. É um ponto importante reconhecer que se a forma humana na Figura 3 for girada em torno de seu ponto central (o umbigo), as mãos e pés traçarão um círculo que circunscreve exatamente o quadrado. Também, com relação aos símbolos do zodíaco que aparecem na Figura 3, o leitor notará que o zodíaco é exibido tipicamente em formato circular, correspondendo à esfera celestial. O fato de que os símbolos do zodíaco aparecem na borda, como eles o fazem nesta figura, pede ao observador que visualize um círculo inscrito dentro do quadrado externo. Favor notar também que os símbolos do zodíaco também são críticos para um entendimento da interpretação filosófica da figura.
Na Figura 4, as mãos e pés da forma humana, quando giradas de maneira semelhante, traçarão um círculo que é exatamente inscrito no quadrado. A Figura 4 exige que para análise geométrica, ignoremos temporariamente os valores numéricos que aparecem em cada uma das seções triangulares do desenho. Observe que ausente a forma humana, a Figura 4 se parece com a Figura 3, exceto que duas linhas adicionais foram adicionadas perpendicularmente uma à outra e interceptando-se no centro.
A Figura 5 é uma composição da Figura 3 e da Figura 4, ausente a forma humana, zodíaco e números e com as formas geométricas rotuladas para facilitar a discussão. A Figura 5 adiciona, entretanto, dois círculos concêntricos à composição. Um dos dois quadrados (ABDC), portanto, parece circunscrito em relação ao círculo maior, e o outro (EFGH) parece inscrito no círculo menor. Estes quadrados estão dispostos de tal forma que as diagonais do quadrado EFGH (Linha FH e Linha EG) são tanto os diâmetros do círculo, quanto a altura e largura, respectivamente do quadrado ABDC. As múltiplas interseções das diagonais dos quadrados e das diagonais com os lados dos quadrados produzem não menos que dezesseis (16) triângulos isósceles idênticos.
Não é especialmente difícil determinar a significância geométrica subjacente destas figuras. O leitor poderá prontamente distinguir que a área do Quadrado ABDC é duas vezes aquela do quadrado EFGH, baseado estritamente no fato de que o raio dos dois círculos está em uma relação de 2:1 com relação ao outro. Isto, naturalmente, coloca a altura dos dois quadrados em uma relação semelhante, e também a área dos quadrados.
A conseqüência desta figura é, então, que quando um quadrado está circunscrito em relação a um círculo, sua área será duas vezes aquela de um quadrado inscrito no mesmo círculo. O dois círculos concêntricos na Figura 6 compartilham um relacionamento semelhante; a saber a área do círculo circunscrito em relação ao Quadrado ABDC tem duas vezes a área do círculo inscrito no Quadrado ABDC. Este conceito é resumido no Livro de Arquimedes de Lemmas [vii], Proposta 7 onde é afirmado:
“Se círculos são circunscritos em relação ao outro e inscritos em um quadrado, o círculo circunscrito é o dobro do quadrado inscrito.”
A Proposta 7 é conhecida como a base pela qual Arquimedes aproximou o valor de Pi (3,14159…) usando seu famoso método de exaustão [viii]. Este conceito está também refletido por Euclides no Livro XII de Elementos, Proposição 1 [ix]. Estas figuras foram cruciais na descoberta, mais tarde, das (Figura 6) propriedades matemáticas da luna de Hipócrates [x] (Uma luna é uma figura plana limitada por dois arcos circulares de raios diferentes, i.e. um crescente [xi]) por Euler em 1771 [xii]. As figuras de Agrippa ilustradas aqui e também a luna ocuparam uma posição proeminente na procura imemorial da “Quadratura do Círculo”. Isto foi, naturalmente, antes da descoberta de que o valor de Pi era um número indeterminado.
Observe-se que na Figura 6, o Quadrado ABDC é quatro vezes maior do que o Quadrado AFOE. A diferença em áreas relativas dos dois quadrados e também dos dois círculos formando a Luna são, portanto, proporcionais.
Em seu livro, A Música de Pitágoras [xiii], a autora Kitty Ferguson descreve uma cena de Meno de Platão onde Sócrates e Meno estão discutindo a figura de um quadrado de quatro pés que Sócrates desenho na areia. É relatado que durante a discussão, Sócrates usa este quadrado como base para a construção de uma figura idêntica àquela mostrada na Figura 5, menos os círculos. Enquanto desenvolvia esta figura, Sócrates conduz um dos servos de Meno em um diálogo onde o servo deduz que a área do quadrado maior é duas vezes aquela do quadrado menor. Toda a finalidade desta cena em Meno é ilustrar que o homem é capaz de desenvolver conhecimento por dedução, e não depender simplesmente de conhecimento prévio, ou conhecimento que já está totalmente desenvolvido e presente no nascimento. Não há dúvida, as figuras publicadas mais tarde por Agrippa incluem o simbolismo da capacidade do homem de discernir e empregar raciocínio dedutivo. Entretanto, são os princípios Geométricos e não os Filosóficos que são de interesse neste trabalho; é notável com relação a isso que duas figuras de interesse ilustram características proporcionais da forma humana que não estão diretamente relacionadas com a Média Dourada (Phi ou a Proporção divina). Este não é o caso com o Homem Vitruviano de Leonardo, nem é o caso com as figuras restantes oferecidas por Agrippa (como mostra a Figura 2).
Isto não quer dizer que o valor de Phi não pode ser desenvolvido usando estas duas figuras, que ele pode claramente ser (Figura 7). Entretanto, o valor de Phi não coincide com características distintas do corpo nestas figuras. O fato de que estas figuras sejam incluídas com uma série de esquemas que claramente descrevem as proporções Phi do corpo humano nos levariam a acreditar que Agrippa considerava as relações geométricas entre quadrados e círculos inscritos e circunscritos como suficientemente não-coincidentes, a ponto de serem consideradas evidências da origem divina do Homem.
Isto é de interesse especial para a Maçonaria, uma vez que duas figuras sendo discutidas revelam proporções geométricas absolutas na forma humana, e não dependem de princípios matemáticos (isto é, não-geométricos) para apresentar este argumento.
Na Figura 7, consideremos o quadrado AFEO. Se presumirmos que os lados deste quadrado têm um valor dimensional de uma (1) unidade, então a diagonal deste quadrado (linha AO) tem um valor igual à raiz quadrada de dois. O valor de Phi é associado muito de perto com a raiz quadrada de dois, sendo igual à raiz quadrada de dois mais meio (1,414213 + 0,5 = 1,614213). Portanto, para demonstrar o valor de Phi em nossa figura, temos apenas que adicionar o valor de meia unidade à diagonal AO. Conseguimos isso, bisseccionando a linha OH, construindo uma linha através dos centros dos quadrados ECHO e GDHO, criando o Ponto J e, portanto, segmento de linha OJ. Desenhando um arco de comprimento OJ usando o Ponto O como centro, de tal forma que ele interrompa a linha OD (no ponto K), formamos o segmento de linha OK. Toda a linha AK, então, tem um comprimento igual à raiz quadrada de dois mais meio, que é o valor de Phi.
Heráclito (540-480) recebeu o crédito por dizer “O homem é a medida de todas as coisas” [xiv]. Esta Figura é, assim como são as duas figuras na Filosofia Oculta de Agrippa, a representação geométrica do Homem como criação divina, centrado no universo, com as faculdades dadas por Deus da razão, e fisicamente formadas em proporção divina.
NOTAS:
[i] Agrippa, Heinrich Cornelius. (1995). Three Books of Occult Philosophy. In Donald Tyson (Ed.). The Foundation Book of Western Occultism. Llewellyn. ASIN: B000KT6YLK.
[ii] Agrippa of Nettesheim, Heinrich Cornelius. (1651). Three Books of Occult Philosophy. Book 2. London. In Joseph H. Peterson (Ed.). [Digital Edition] . Retrieved June 18, 2008, from http://www.esotericarchives.com/agrippa/agrippa2.htm.
[iii] Vitruvius, Pollio. De Architectura (The Ten Books on Architecture). In Project Gutenberg (2006). Retrieved June 18, 2008, from http://www.gutenberg.org/etext/20239.
[iv] Image Source: The Ohio State University Fine Arts Library. Retrieved June 18, 2008, from http://library.osu.edu/blogs/finearts/2008/02/14/be- mine-frank-ohara/.
[v] Hatzigeorgiou, Karen J. (2008). Public Domain Images Reproduced by Agreement of Terms of Publication. Retrieved June 18, 2008, from http://karenswhimsy.com/sacred-geometry.shtm.
[vi] Agrippa von Nettesheim, Cornelius. (1651) De Occulta Philosophia Libri Tres. Edited by V. Perrone Compagne. in Studies in the History of Christian Thought, 48. Leiden: Brill. (1992).
[vii] Archimedes. in Bogomolny, Alexander, Archimedes’ Book of Lemmas from Interactive Mathematics Miscellany and Puzzles. Retrieved June 23, 2008 from http://www.cut-the-knot.org/Curriculum/Geometry/BookOfLemmas/index.shtml.
[viii] Carothers Neal. Archimedes’ Method of Exhaustion. Department of Methematics and Statistics. Bowling Green State University. Retrieved June 22, 2008 from http://personal.bgsu.edu/~carother/pi/Pi3a.html.
[ix] Euclid’s Elements, Book XII. In Joyce, D.E. (1997) Euclid’s Elements. Clark University. Retrieved June 22, 2008 from http://aleph0.clarku.edu/~djoyce/java/elements/bookXII/propXII2.html.
[x] Sandifer, Charles Edward. (2007). The Early Mathematics of Leonhard Euler. The Mathematical Association of America – Tercentenary Euler http://www.freemasons-freemasonry.com/occult_philosophy.html 27/7/2008 Celebration. Vol. 1.Washington, D.C. ISBN:0883855593
[xi] Weinstein, Eric. (2008). Lune. Wolframs Math World. Wolfram Research. Retrieved June 22, 2008. From http://mathworld.wolfram.com/Lune.html
[xii] Euler, M.J.A. Réflexions Sur la Variation de la Lune. Publication l’Académie 1766, 18 pp.
[xiii] Ferguson, Kitty. The Music of Pythagoras. (2008). New York. Walker & Company. Macmillan (Dist.) ISBN-10: 0-8027-163-8; ISBN-13: 978-0- 8027-1631-6. pp. 140-145.
[xiv] Hemenway, Priya & Ray, Amy. (2005). Divine Proportion: Phi in Art, Nature, and Science. Sterling. ISBN:1402735227. pp. 92.