“A ideologia científica moderna age como se obrigasse o homem a morar em apenas um quarto de sua casa, o quarto mobiliado pela ciência.
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Todos os outros cômodos são proibidos, sob a alegação de serem não-científicos, irreais, ilusórios, doentios, fantasiosos e produtos de nossa sugestão. Assim, a ciência de hoje entorpece nossas consciências, em vez de iluminá-las e arejá-las, e encobre nossa identidade, em vez de ajudar-nos a encontrá-la!”
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Até que ponto a expressão “científico” é sinônima de “fidedigno”? Ou seja, até que ponto podemos confiar na “ciência”?
Muitas publicações em todo o mundo se ocupam de problemas científicos, mas foram e continuam sendo consideradas “ não – científicas” por críticos que pretendem para si a exclusividade da denominação. Apenas uma coisa mudou de fato: a expressão “não – científica” aplicada a tais publicações está perdendo seu caráter pejorativo.
A acreditar em alguns autores, hoje em dia o fato de uma publicação ser considerada “não- científica” está deixando de ser uma vergonha para se transformar numa glória. Pois o que estes autores estão atacando em suas obras é o nosso modo costumeiro de pensar sobre o que é científico e o que não é.
O exemplo mais marcante é o livro A Medicina Num Beco Sem Saída, do médico holandês H.S. Verbrug, onde o autor toma o desenvolvimento da medicina como ponto de partida para o seu ataque.
O médico e professor M. J. de Vries, já havia postulado que a medicina atual é baseada num modelo pré-científico, num paradigma. De acordo com esse paradigma, a base de todas as coisas é formada exclusivamente por forças químicas e físicas. Foi baseada nesta ideia que toda a medicina moderna começou a se desenvolver.
“Não existem no organismo outras forças senão as forças químicas e físicas. O que hoje em dia não pode ser explicado pela existência dessas forças tem que ser deduzido delas pela aplicação do método físico-matemático, ou atribuído a outras forças semelhantes as forças químico-físicas inerentes à matéria, e que tem sua base nas forças de atração e rejeição. ”
Este postulado, datado de 1842, é seguido incondicionalmente em qualquer obra científica da medicina, até hoje, sem que jamais tenha sido discutido. Ele é a base de nossa medicina atual.
As faculdades de medicina passam fria e estupidamente por cima do fato de que em outras regiões do mundo as pessoas pensam totalmente diferente sobre saúde e doença.
Para nossa ciência, tais pessoas simplesmente não existem, ou, pior, são consideradas ignorantes e primitivas.
Nessas faculdades, não se dá o merecido destaque ao estudo da história da medicina. É um desprezo que cabe muito bem à pretensão da nossa medicina de que “só nós sabemos tudo; o resto é ignorante”.
Quando, há cem anos, Helm Holtz, Claude Bernard e outros deram à medicina sua forma atual, nasceu a convicção de que em princípio uma medicina melhor que a nossa é impossível.
Pode-se confiar na ciência?
Em seu livro, Verbrugh argumenta que muita gente de todos os tipos não está mais confiando na “ciência”. Um exemplo disto é que não se pode chegar a uma solução para o problema do controle do meio ambiente através da ciência, uma vez que esta é eficaz apenas na fragmentação da realidade.
O problema, segundo os nossos meios científicos, tem que ser dividido e redividido em problemas e probleminhas que, um a um, devem ser resolvidos separadamente. No entanto, a realidade é tão entrelaçada, tão inseparável, que os nossos métodos científicos são absolutamente imprestáveis.
Num nível menos consciente e mais pessoal, a ciência, devido à sua influência cada vez maior sobre o pensamento de cada pessoa, tornou-se um perigo ainda maior. A fragmentação inata no modo científico de pensar mina a percepção intuitiva da união inquebrantável da realidade, condição sine qua non para o funcionamento saudável da nossa psique.
Círculo vicioso
Este perigo foi formulado com exatidão por um professor de medicina, em 1966. Disse ele:
“Existem tendências em nossa civilização para simplesmente reprimir no ser humano o desejo de procurar a verdadeira base de nossa existência. E essa repressão é ainda mais violenta porque este desejo, inato a todos os seres humanos, pertence a uma dimensão que o gênio tecnocientífico não conhece”.
Assim, o professor mostrou com perfeição o círculo vicioso de nossos tempos. Crises econômicas e o fato de que somos totalmente indefesos perante o futuro, levam ao reconhecimento de que precisamos de uma reorientação radical, de uma mudança de percepção.
O pensamento de que as condições para chegar a essa reorientação não existem nos métodos de pensamento que conhecemos, e o fato de que é justamente esse pensamento o único método certo de chegar a ideias concretas sobre o controle do futuro, completam o círculo vicioso.
Verbrugh aprofunda-se neste círculo vicioso, argumentando que a ciência, graças ao seu indiscutível progresso nos últimos cem anos, adquiriu imensa autoridade, refletida na auto-segurança maciça e total com a qual ela se apresenta. A ciência muitas vezes é comparada com a Igreja na Idade Média: sua autoridade é absoluta.
A ciência mostra incessantemente como suas opiniões sobre si mesma são corretas. Ao mesmo tempo, ergue barreiras fundamentais para impedir modificações radicais no pensamento do homem. É a ciência a grande responsável pelo mundo como ele se apresenta hoje, e pelos padrões humanos sobre os quais nossa sociedade está constituída.
O pensamento científico trouxe à humanidade progresso e liberdade, e pode continuar a fazê-lo. Mas para isto temos que reconhecer o erro de algumas ideias unilaterais, apresentadas incorretamente como fatos científicos. Tais ideias levam a um modelo bastante restrito e condicionado do homem. E sobre este modelo nunca conseguiremos construir um futuro humano.
Para podermos enfrentar o futuro, precisamos de outras ideias sobre o ser humano e o que ele na verdade é. Em teoria, cada pessoa em nossa sociedade tem o direito e a liberdade de formar sua própria visão da humanidade.
Mas, na prática, o que significa essa liberdade, quando ideias restritas são injetadas em nosso pensamento como se fossem verdades absolutas, quase sem percebermos?
Não se trata de ser contra a ciência moderna, mas, sim, de ser contra a pretensão desta ciência em se considerar a única com o direito de formar teorias e praticá-las.
A ideologia do pensamento científico
A imagem que temos de nós mesmos nos é dada pela ciência. Esta nos ensina que é válido somente o que pode ser pesado, medido, presto e classificado. Ou seja, a ciência nos impõe a opinião de que não existe realidade fora daquela que pode ser vista e compreendida por nossos sentidos e nossa mente como conhecemos hoje.
Este processo se fortalece cada vez mais. Precisamente porque não existe outra imagem-modelo, aquela que “cientificamente” é construída torna-se automaticamente o protótipo do normal. E quanto mais aquele modelo é aceito, ele se afirma cada vez mais, adquirindo maior prestígio como norma para medir novas formas de existência humana. Os atributos humanos que não cabem no modelo são simplesmente ignorados.
Outro motivo que torna difícil a possibilidade de nos libertarmos da opressão da ciência do século 19 é que, em sua ideologia, ela não tem espaço para uma consciência histórica.
Com espantosa segurança, a ciência ocidental moderna apresenta-se como a única verdadeira. Mesmo os cientistas profissionais não estão cientes do fato de que essa ciência desenvolveu-se dentro de um processo histórico, e, como tudo que existe e vive, ela entrará em declínio e será substituída por outra coisa.
Numa sociedade que está impregnada pela ideia de que o homem é um macaco com uma inteligência um pouco acima do normal, iniciativas que não cabem neste modelo são, no máximo, toleradas como hobbies particulares e inofensivos. Todas as características potenciais do homem que não cabem neste modelo zoológico não são reconhecidas e, por isso, não se desenvolvem e acabam morrendo.
As ciências médicas e biológicas, de mãos dadas com o behaviorismo, abriram o caminho através do qual será possível que uma vida humana seja totalmente programada, desde a concepção (espontânea ou artificial) até a morte (natural ou por eutanásia).
Nós estamos presos numa ideologia sobre o homem e a natureza que não oferece qualquer esperança para o futuro, e que, infelizmente, é a única ideologia que conhecemos. De que modo conseguiremos, então, um programa interessante para o futuro?
A condição para a solução é reconhecer que de fato a ciência trouxe uma colaboração única e inestimável para a evolução humana, mas que somente pode continuar se ela não estagnar os seus dogmas — que é exatamente o que está acontecendo.
Esta ideologia age como se obrigasse o homem a morar em apenas um quarto de sua casa, o quarto mobiliado pela ciência. Todos os outros cômodos são proibidos sob a alegação de serem não-científicos, irreais, ilusórios, doentios, fantasiosos e produtos de nossa sugestão.
Assim, a ciência de hoje entorpece nossas consciências, em vez de iluminá-las e arejá-las, e encobre nossa identidade, em vez de ajudar- nos a encontrá-la.
Por uma imagem nova do homem
A nova imagem não pode nascer de velhas e tradicionais ideologias. Ela tem que ser aceitável à ciência moderna, sem recair em parcialidades em relação ao que o ser humano é ou não é, parcialidades que hoje em dia ameaçam o próprio homem e sua sobrevivência como ser humano na plenitude da palavra.
Mas, já que não conseguimos imaginar o homem senão através dessas parcialidades e restrições, isso significa que temos de nos preparar para começar da estaca zero com toda a nossa bagagem intelectual e emocional.
Uma imagem nova do ser humano não chegará a nós pronta para entrega; não pode ser imposta de cima ou de fora, tem que tornar- se uma experiência autêntica e pessoal de cada ser humano, com a mesma lucidez convincente de uma imagem sensorial.
A consciência e a compreensão das coisas que estou procurando crescem durante a procura, fazendo com que finalmente eu reconheça o que encontro, definindo-o como aquilo que estava procurando.
Porque somos nós que fazemos a imagem do homem, e com isso o homem do futuro, com as nossas ideias, nossa vontade e imaginação a respeito daquilo que queremos, tornar-se-á real.
Verbrugh cita a antropóloga Margaret Mead, particularmente sua tese sobre a diferença entre três tipos de culturas. Em culturas pós-figurativas, os pais lideram e impõem valores de todos os tipos. As crianças apenas aprendem dos adultos, e ninguém sequer pensa que o futuro possa ser diferente do passado.
Nas culturas co-fígurativas, é o comportamento dos contemporâneos que vale; os valores são estabelecidos mutuamente através de um relacionamento entre adultos e jovens.
Nas culturas pré-figurativas, não são nem os velhos nem os jovens que lideram, mas a geração futura. E é essa cultura que hoje em dia está começando a formar-se.
A geração mais jovem mostra cooperação e um interesse incondicional para as pessoas como indivíduos, e para a humanidade como um todo.
Além disso, ela está consciente do fato de que o mundo é um só, mas que toda a experiência dos velhos (e jovens) não é suficiente para resolver seus problemas. Em vez do velho digno, grisalho e autoritário que, em culturas pós-figurativas, representou passado e futuro, com toda a sua grandeza e continuidade, é hoje a criança, ainda no ventre materno, que é o símbolo do futuro.
Os adultos não devem mais condicionar seus filhos e programá-los conforme valores antigos e ideais superados. Nós não devemos impor á nova geração valores estabelecidos, mas, ao contrário, inspirá-la para se envolver em algo que eles mesmos reconheçam como valioso.
Antes da concepção
Verbrugh formula então sua própria hipótese, expressando-a da seguinte forma: “Nós temos que ter a coragem de nos identificar com aquela parte de nossa personalidade que surgiu antes do momento em que se formou nossa corporacidade”.
Isso quer dizer que cada ser humano, antes de sua concepção, já existia e existe em sua essência, uma essência que se une, no momento da concepção, com a matéria biológica fornecida pelos pais.
Segundo Verbrugh, deve ser possível examinar essa existência pré-natal. Para tanto, devemos satisfazer duas condições:
- Devemos estar preparados para aceitar que outras influências – e não apenas aquelas que podemos entender através do pensamento normal – representam um papel na vida humana.
- Devemos reconhecer que a observação interior e o julgamento da própria vida e suas ações podem – sem dúvida alguma – levar à compreensão da realidade. E justamente para essa segunda condição existem graves obstáculos na ideologia da ciência atual.
É muito importante, diz o autor, diferenciar a verdadeira recordação da existência pré-natal, da imagem que convencionalmente fazemos de uma preexistência, de modo que a recordação possa tornar-se real.
A crítica é uma dádiva importante da ciência moderna, e devemos estar cientes de que o ser humano é bastante inclinado à especulação e à sugestão: ideias sempre vêm antes da experiência; o pensamento de que algo existe sempre vem antes da descoberta.
Antes de Newton, as maçãs caíam das árvores do mesmo modo que hoje, mas este fenômeno não era então importante. Somente depois do reconhecimento do problema e da intensiva atenção dada ao fato pelos físicos é que fizeram dele um fenômeno importante, transformando-o no ponto de partida para as modificações trazidas ao mundo pela ciência.
A situação da preexistência assemelha-se um pouco a este fato. Atualmente, dentro do padrão da ideologia aceita, a ideia de uma existência pré-natal é uma especulação sem qualquer fundamento. E assim será até que, num belo dia, uma grande maioria aceitará a possibilidade de uma provável recordação daquela preexistência, numa aproximação da realidade radicalmente diferente da atual. Então poderemos dar um novo sentido à existência humana e à liberdade.
Arthur Kostler já chamou a atenção sobre a armadilha em que caíram tanto Jung como Pauli: que eles, com os métodos e modos de pensar da ciência deste mundo material, tentavam pesquisar uma região onde reinavam outras leis que não aquelas da lógica casualística.
Kostler formulou sua critica da seguinte maneira:
- Nosso próprio mundo material, com suas leis de lógica, de causalidade, está subordinado a:
- Um mundo muito maior do qual somos apenas uma parte – com suas próprias leis, e uma meta própria que não conseguimos, por enquanto, entender.
Quando Verbrugh fala de pesquisas no campo da preexistência, não deve esquecer-se de que no reino de onde vêm as essências que estão se preparando para a reencarnação vigoram outras leis que não as do nosso mundo material. Somente assim as pesquisas conseguirão levar-nos a resultados concretos.
Fonte: Revista Planeta, edição de 1975
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