Um corpo celeste descoberto em 2000 no cinturão de Kuiper, inexplorada região além da órbita de Plutão, parece corporificar simultaneamente o simbolismo conectado à divindade Varuna, da mitologia védica, e ao deus grego Oceanus, um rei universal destronado.

Introdução

A busca por mundos além de Plutão tem agitado o ânimo dos que se interessam por assuntos siderais. Os astrônomos voltam suas lentes de grande alcance para as fronteiras do reino de Plutão, o chamado cinturão de Kuiper, na esperança de encontrar corpos do tamanho ao menos de Marte ou Mercúrio. Até o momento, surgem descobertas como Quaoar, cujo nome e o período orbital invocam o planeta hipotético Cupido, da Astrologia Uraniana.
Os astrólogos, tanto os sérios como os que esperam uma nova moda, aguardam notícias de novos mundos que já foram profetizados inúmeras vezes.
E em meio à escuridão das fronteiras plutônicas vão surgindo outros planetóides, cujos nomes parecem indicar divindades e condenados do mundo dos mortos. Orcus recebe o nome do deus romano da morte. Esta divindade latina se confunde com Plutão. Tal semelhança religiosa ajudou a determinar o nome, pois Orcus possui uma órbita que imita e segue a de Plutão, ele é um mímico do nono planeta.
Alguns dominam mais a atenção do que outros. É o caso de Varuna e Quaoar, talvez porque o estudo se mostre mais propício, devido a nomes que facilitem o entendimento de suas influências.
O cinturão de Kuiper é uma vasta região do sistema solar situada além da órbita de Netuno e parcialmente cruzada pela órbita de Plutão. Nesta região vêm sendo encontrados diversos objetos nos últimos anos, normalmente definidos como planetóides: Íxion, Quaoar, Varuna, Sedna e, mais recentemente, um corpo celeste maior que Plutão, provisoriamente chamado Xena.

Quando Varuna foi descoberto

Um caso interessante é o de 2000 WR106, oficialmente nomeado como Varuna, deus criador, da mitologia védica. Em 2000 R. S. McMillan e J. Larsen descobriram um corpo que orbitava além de Plutão, seu período orbital era de 282 anos. Sua descoberta teve considerável atenção e alguns astrólogos como Juan A. Revilla, da Costa Rica, e Denis Kutalyov já se dedicam a estudá-lo.
Porém a existência de 2000 WR106 já havia sido sugerida bem antes da descoberta de McMillan e Larsen. Em 1904 Thomas Jefferson Jackson See estipulou a existência de três planetas além de Plutão. See foi quem postulou em 1909 a teoria de que a Lua era um planeta com órbita própria que fora capturado pela força gravitacional da Terra. Entre os três planetas hipotéticos de See, estava um que ele batizara como OCEANUS, cujo período orbital é praticamente igual ao de Varuna, 272 anos.
A diferença de 10 anos entre a órbita prevista por See e a órbita real de 2000 WR106 não impede que os dois corpos sejam considerados o mesmo. Um exemplo claro de que este pequeno valor diferencial não é tão relevante foi a descoberta de Netuno. Quando Adam e Le Verrier descobriram Netuno, os cálculos que ambos estabeleceram para a órbita do planeta divergiam da realidade, e mesmo assim o planeta foi visto e nomeado como devia.

Varuna e os mitos gregos, um mar de coincidências

varunaComo dito antes, Varuna (à direita) era o deus criador da mitologia védica. Era sua divindade mais augusta. Segundo o hinduísmo, Varuna encarna o céu e o oceano, e todos os poderes criadores e reguladores da vida.
Varuna possuía o conhecimento infinito. Criou o sol, esvaziou os leitos dos rios e se encarregou que o oceano nunca estivesse demasiado cheio. [Atlas do extraordinário: Mitos e Lendas, p. 173, ed. 1996].
Todavia, mesmo sendo tão poderoso Varuna acabou por tornar-se um deus secundário, substituído por Indra como rei do universo. Ficou assim relegado como divindade da noite, dos oceanos, senhor da justiça e das leis e dono do quadrante Oeste. Como governante deposto Varuna encontra analogia na personagem de Urano, deus do céu e primeiro regente do mundo na mitologia grega. A etimologia de ambos os nomes sugere uma relação mítica:
A etimologia do nome é duvidosa; pode tratar-se de um cognato do grego Urano “céu”. Dicionário de Deuses e Demônios (p. 215, 1993).
A consideração entre os nomes reforça a idéia de relações entre a cultura grega e a cultura indiana. O épico A Dionisíaca, do poeta Nonnos, relata as aventuras do deus grego Dioniso na Índia dos tempos védicos. Por sua vez, o alfabeto latino utilizava a letra “v” como “u”, e mesmo estando tão distante da língua sânscrita ligou-se fortemente a cultura grega. Varuna, então, pode ser lido “Uaruna” já que Urano em grego puro é “Ouranos”. A posição das vogais e consoantes, e a estrutura fonética geram uma inquietante insinuação.
gaya mnVaruna também encontra paralelismo com o deus grego Oceano, que era filho de Urano. Oceano era filho de Gaia, Mãe Terra. E Varuna também era filho de uma Mãe Terra, Aditi.
Oceano é o elemento original que apareceu antes do próprio mundo e que preside à criação; Oceano tem um papel importante na mitologia. Filho de Urano e Gaia, ele é a personificação divina da água. Circunda a terra como um imenso rio onde tudo se cria e aonde tudo vem morrer. É o pai de cerca de três mil rios (os Pôtamos) que alimentam a terra. Tétis, sua esposa, concebeu uma multidão de filhas, as Oceânides. Tardiamente representado nas obras de arte, Oceano, com aspecto de um ancião de barba esverdeada, segura um corno de touro, que simboliza a abundância poderosa e alimentadora das águas. (SCHMIDT. P. 201)
jupiterOceano era o primogênito entre os filho da Terra e do Céu, considerado cortês e profundamente sábio. Podendo ver o futuro nefasto dos outros Titãs, aconselhou sua filha Estige e se pôr junto com os filhos ao serviço de Júpiter. Deste modo ela foi honrada. Suas inúmeras filhas são personificações da sabedoria e das leis que dominam o cosmos: Métis “o conhecimento”, Tiké “a fortuna” e Plutó “a riqueza”. As Néfeles, outras filhas suas, eram ninfas deusas das nuvens. Por isso, os gregos apelidaram as nuvens de “Jardins de Oceano”, pois consideravam que nasciam no horizonte ilimitado, a morada do deus.
Esta relação simbólica entre o céu e mundo das águas é forte em Varuna. Ele podia crescer tanto que suas costas eram capazes de suportar os dois oceanos do mundo, o ar e as águas. Talvez se possa considerar a ligação entre céu e oceano com o fato de ambos se perderem um no outro quando os contemplamos no horizonte. Poeticamente, as nuvens imitam, em meio ao azul celeste, as espumas das ondas marinhas em movimento constante.
Sendo Oceano o senhor do rio universal, era em tudo Onipresente e não necessitava subir ao Olimpo para conhecer os desígnios de Júpiter. Ésquilo nos mostra o quão bom e sábio ele era ao tentar apaziguar a querela entre o titã Prometeu e Júpiter em Prometeu Acorrentado. Do mesmo modo, nada podia se ocultado de Varuna, que conhecia todos os segredo dos homens administrando a justiça e as leis que mantinham a harmonia o mundo.
Os povos da antiga Índia sabiam o quanto era difícil guardar um segredo… … “se duas pessoas sentam-se juntas e planejam, o rei Varuna está presente como se fosse um terceiro e sabe de tudo”. (Superinteressante: coleção divindades III, Indianas. p. 90-91).

Oceano, um antigo rei do universo?

serpente_cosmicaOs mitos Órficos, uma tradição grega particular, cujos ritos e relatos parecem aderir influências religiosas orientais, falam sobre um antigo regente universal dono dos atributos de Urano e Oceano.
Saturno (Cronos), desejando ser rei do universo, declarou guerra contra Ófion, um titã com aparência de serpente. Ófion governava no Olimpo, mas foi destronado e lançado no inferno. Em uma variante, ele se exila no oceano que circunda a Terra.
Ófion é um aspecto antigo e direto de Oceano, que, devido a uma possível evolução ou estratificação do mito, também originou Urano. Como Varuna, o titã Oceano também foi um rei universal destronado. Varuna perdeu seu trono por motivos diferentes. Não podendo vencer o terrível dragão Vitra que engoliu as águas universais, teve de aceitar que o jovem Indra demonstrasse suas forças vencendo com os raios o demônio cruel. Após a vitória, Varuna cedeu seu trono ao novo rei, Indra.
De certo modo o mito da serpente vencida parece ser aludido no mito nas tradições gregas de Ófion, um deus serpente vencido por Saturno. Porém Indra se identifica com Júpiter, Filho de Saturno, porque ambos tem os raios como arma.
Então Varuna guarda relação com serpentes e monstros aquáticos; não é por nada que os utilizava como montaria. E Oceano gosta de se acercar das mesmas criaturas. A arte antiga dos gregos, em seus vasos mostra um Oceano metade homem metade serpente.

Oceanus, o planeta e Thomas J. J. See na astrologia

A ilustração mostra diversos o tamanho relativo de diversos planetóides encontrados no cinturão de Kuiper e seu tamanho relativo quando comparados com Plutão e seu satélite, Caronte. O planetóide 2001 KX76 vem sendo chamado de Íxion. O único objeto de dimensões compatíveis com a designação de planeta é o 2003 UB313, chamado provisoriamente Xena, cujo diâmetro é 17% maior do que o de Plutão.
Antes de considerar Varuna, é interessante repensar a quem deve ser dado o mérito pela descoberta de 2000 WR106, e qual seu verdadeiro nome. Pois, mesmo não o vendo, Thomas J. J. See postulou sua existência com um erro pequeno de período orbital. A McMillan e Larsen coube apenas encontrá-lo. E considerando que Oceanus é o conhecido 2000 WR106, hoje chamado de Varuna, notamos sua influência astrológica observada e nos trabalho de alguns astrólogos. Talvez tenha influência sobre o signo de Touro e sobre a Casa II ou ainda sobre Sagitário e a Casa IX, considerando-se que Oceanus é um deus dos limites e que vê além das barreiras.
Oceanus fala de riqueza e da abundância de bens, mas não apenas de modo cumulativo, mas dispersivo também; uma fonte abundante que dispersa seus frutos. Por isso a cornucópia é seu símbolo, junto com o Touro, seu animal consagrado tanto pelos gregos como, segundo dizem, pelos atlantes.
O mito dos atlantes sugere abundância de riquezas, tranquilidade e também abundante riqueza de conhecimento e sabedoria, pois está relacionada a Oceanus. Sendo um antigo regente do mundo, preside a observância das leis para a harmonia dos ciclos da vida. Como imagem da sabedoria, revela organização e difere de Netuno, O Místico, ligado ao mundo onírico das forças narcotizantes, ilógicas e confusas.
oceanusAlguns astrólogos sugerem que possua atributos da Casa XII, casa dos aspectos incompreensíveis da vida, que agem de modo indireto e distante. Talvez seja possível esta análise, já que Oceanus não perdeu de todo a sua regência, mas sim divide o governo das águas com Netuno. Enquanto Oceanus demonstra passividade e organização, Netuno fala do ilógico com atividade rigorosa.
Kutalyov observa que, vindo após Plutão, Oceanus (Varuna) não nos leva para as alturas ao invés de continuar a descer às profundezas do rei subterrâneo. Oceanus então possui um aspecto dual, pois eleva às alturas do céu e conduz aos abismos aquáticos. Considera que Oceanus influencia no ganho de notoriedade e glória imortais para além da popularidade presidida pelo fausto planeta Júpiter, e ainda diferindo de Júpiter quanto a leis e justiça secular, ele é a personificação da justiça e eqüidade divina. Essa eqüidade faz dele um nivelador que harmoniza e iguala os homens de modo divino.
Kutalyov se refere ainda a algumas data estudadas nas quais o poder de Oceanus se mostra significativo:
  • 3 de setembro de 1783 – durante a conjunção exata de Varuna com o Sol, o Tratado de Paz de Paris foi realizado: A Europa tinha permitido a existência do novo Estado independente, os Estados Unidos da América.
  • 2 de março de 1917 – durante a conjunção aproximada de Varuna com o Sol, o imperador russo Nicolau (Nikolai) II abdicou. Um ano após, outra vez durante a conjunção de Varuna com o Sol, o tratado de Brest-Litovsk foi assinado (terminou a guerra entre a Rússia e a Alemanha). E no mesmo dia o famoso poema revolucionário “doze” de Alexander Blok foi publicado. Uma nova Rússia emergiu – a Rússia, que recusou a monarquia e adotou uma nova ideologia.
  • 28 de abril de 1955 – durante a conjunção do Sol com Varuna, realizava-se o começo da construção de Baikonur (o espaçoporto, de onde os primeiros sputniks e naves espaciais foram lançados ao espaço).
  • 9 de maio de 1960 – nos EUA, pela a primeira vez no o mundo, as pílulas contraceptivas foram vendidas. A situação planetária do dia é bem descrita pelos aspectos de Varuna – estava em quadratura com Urano (para dizer “não” às coisas inesperadas), trígono Saturno (“sim” ao planejamento), conjuntamente com o Sol (uma conexão com o começo vital).
  • 5 de junho de 1981 – o centro de serviços de saúde pública em São Francisco informou sobre conseqüências perniciosas da pneumonia entre os homossexuais. A pesquisa especial tinha mostrado que a diminuição rápida da imunidade celular tinha sido observada. Era o primeiro anúncio sobre a nova doença, que é chamada hoje de AIDS. O único aspecto principal do Sol neste dia era a conjunção muito precisa com Varuna.
varuna 3Estes dados foram retirados de um artigo escrito por Kutalyov. Ele também observou as posições de Oceanus (Varuna) em cartas natais de pessoas famosas e ligadas ao poder. Sua influência é crucial sobre síntese, integração, conclusão, decisão e a fluência das coisas. Ele abre os canais para o fluxo das energias assim como os fecha.
As semelhanças com Júpiter parecem muitas, e não há diferença entre leis e justiça secular, e justiça e eqüidade divina. Júpiter governa sobre ambas. Assim as suposições de Kutalyov parecem fracas. Oceanus (Varuna) talvez esteja ligado ao acúmulo de coisas, o acúmulo de sabedoria e aprendizado, com também pode estar relacionado com o modo como lidamos com as perdas de posições ou bens e até pessoas. Talvez fale de como lidamos com mudanças e transformações em nossos mundos, como reagimos com elas e o que acumulamos após. Os mitos de Varuna e Oceanus relatam com força perdas e transformações: ambos perderam governo, mas continuam sábios e poderosos. Todavia, essas observações têm como base apenas a mitologia hindu e grega. Faz-se necessário e sine qua non o estudo da órbita de Oceanus (Varuna) que se aproxima da de Netuno atravessando a de Plutão, e os eventos da época de seu descobrimento.
B. R. Rodrich
Superinteressante
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