Cantinho do Titio

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 ALEISTER CROWLEY

Ele provocou escândalos, despertou fúrias e fez milhares de fervorosos adeptos. Uns consideram-no santo; outros, demônio. Ele chegou a ser riquíssimo e famoso; morreu esquecido e na miséria. Mas sua vida e a obra que deixou provocam polêmica até hoje. Quem foi este homem de estranhos poderes?

Por KEVIN BRIGGS

Um mago do século XX

Edward Alexander (mais tarde Aleister) Crowley nasceu na Inglaterra em 1875, e morreu em 1947. Nesses 72 anos de vida, ele foi o líder espiritual de milhares de pessoas, e também um dos mais temidos e execrados personagens deste século. Ele foi mágico, aventureiro, excêntrico, milionário esbanjador e até alpinista e poeta. Seus seguidores diziam que ele era profeta e santo; a imprensa o acusava de satanista, de viciado em drogas, de escritor de livros vis e mestre de práticas sórdidas e até mesmo de assassino. E ele, pessoalmente, dizia-se um deus.

Santo, pecador, deus, diabo Aleister Crowley foi um enigma eternamente envolto pelo mistério. Suas origens são, no entanto, inteiramente prosaicas. Seu pai era um fabricante de cerveja, relativamente bem de vida; sua mãe, como a maioria das mulheres da era vitoriana, uma fanática religiosa. Ela e o marido faziam parte de uma pequena seita chamada “Os Irmãos de Plymouth”, segundo a qual todo clérigo necessariamente se colocava contra o desejo de Deus expresso na Bíblia, daí professar a necessidade de todo membro se tornar ele próprio um pregador. Para os Irmãos de Plymouth, o fim do mundo estava próximo e eles preci. savam preparar o caminho.
Nesse contexto, é claro que Aleister ouviu trechos da Bíblia desde muito pequeno, mas não parecia se afetar muito. Ele passava a maior parte do tempo sozinho e quieto, mesmo porque o pai já era bem velho quando ele nasceu e a mãe, já um tanto desequilibrada, não lhe dava muita atenção. Do ambiente árido de sua casa, Aleister passou para o mundo severo e ingrato das escolas inglesas daquela época. Foi na escola, adolescente que ele, pela primeira, vez repudiou a fé dos pais. Por distante que fosse dos Irmãos de Plymouth, quando criança, ele várias vezes imaginara que se tornaria algum dia uma espécie de mártir da seita.

Quando ingressou em Cambridge, era um jovem brilhante, bonito e rico, que se considerava um membro da classe dominante, destinada a governar a Inglaterra e o mundo. Aleister levava isso muito a sério e preparava-se para entrar no corpo diplomático britânico. Ele se sentia seguro e distante de tudo o que lembrasse o fanatismo religioso que conheceu na infância. Ele agora não precisava mais nem de Jeová nem de Satã, mas apenas de estímulo.

Aleister queria aventura e perigo, e então começou a praticar o alpinismo, esporte que existia há apenas 60 anos na Inglaterra. Como Baudelaire e Gautier, Crowley comia haxixe e fumava ópio – ambas as drogas eram vendidas livremente nas farmácias. Vivia tão dissipada e luxuosamente quanto sua renda permitia. Possuía livros caros e troféus de caça. Em tudo Crowley se esforçava para ser um dandy eduardiano, um cavalheiro educado. E em grande medida ele conseguiu.
 

O que fazer para entrar na fraternidade

O ano em que ele foi para Cambridge – 1893 – foi sem dúvida ideal para os jovens cavalheiros bem-pensantes. O Príncipe de Gales, Edward Albert, seria rei em breve, pondo fim de vez à já decadente supremacia da Rainha Vitória, é com ele floresceriam as novas filosofias e tecnologias. O sucesso da revolução industrial espalhava uma euforia por toda parte.

Interessado em tudo que fosse fora do comum e elitista, Aleister Crowley tomou conhecimento da existência de uma ordem maçônica secreta chamada “A Fraternidade Branca”, que trabalhava clandestinamente pelo aperfeiçoamento da humanidade. Ingenuamente, ele escreveu para Arthur Edward Waite, um jornalista famoso e autoproclamado rosacruciano e teofista, perguntando-lhe o que deveria fazer para ingressar na Fraternidade Branca.

Waite enviou-lhe um livro do místico alemão Karl von Eckartshausen, A Nuvem sobre o Santuário, que descreve as atividades da tal seita, mas nada revela sobre seus membros, exceto que são “um reduzido número de privilegiados”. Para Crowley, foi uma frustração maior do que se soubesse que a Fraternidade Branca não existia – e parece que existiu de fato, na Alemanha, por mais de 100 anos. Ele escreveu de novo a Waite, perguntando-lhe de que outra seita poderia participar.

Waite disse-lhe que tivesse paciência; que os grandes chefes das sociedades secretas, “seres quase divinos que governam o mundo”, aceitariam-no ou rejeitariam-no no momento certo, e ele não tinha nada mais a fazer senão esperar. Mas Crowley não desistiu, e finalmente em 1896 (o ano em que deixou Cambridge, o mesmo ano da morte de sua mãe), ele ingressou na Ordem Hermética da Aurora Dourada, uma das sociedades secretas mais poderosas da Inglaterra, e uma ramificação da seita alemã. Crowley era agora um homem milionário – sua mãe lhe deixara uma imensa fortuna.

O prestígio e o número de sociedades secretas começaram a aumentar a partir do fim do século 18. Místicos e filósofos falavam em grandes poderes ocultos do homem e todos queriam formar seu próprio grupo para engendrar as grandes transformações pelas quais passaria o mundo. A Revolução Francesa e a guerra de independência dos Estados Unidos foram em grande parte estruturadas por essas sociedades, que produziram um bom número de homens notáveis. Thomas Jefferson, George Washington, Benjamim Franklin, Voltaire, Jean Jacques Rousseau, Sir Isaac Newton. Johann Wolfgang von Goethe e Friedrich von Schiller, foram todos membros de sociedades maçônicas ou rosacrucianas.

A Aurora Dourada surgiu em meados do século 19. Quando Crowley se tornou um de seus membros, já participavam dela o poeta William Butler Yeats, o escritor Algernon Blackwood e Lord AIfred Douglas, o amante de Oscar Wilde. A Aurora Dourada se dedicava principalmente à celebração de cerimônias mágicas destinadas a ajudar seus participantes a desenvolver níveis superiores de consciência, até adquirirem os poderes da projeção astral, da telepatia e da psicocinese.

Desde sua iniciação, Crowley se envolveu com a política interna da sociedade, que ao mesmo tempo o fascinava e desgostava. O que mais o frustrava eram os grandes intervalos entre as promoções de um grau para outro. Crowley tentou convencer os superiores da seita, incluindo o líder máximo, S. L. M. Mathers, a confiar-lhe os segredos dos graus superiores particularmente, rompendo as formalidades do treinamento. Mas aos poucos ele acabou se afastando, desgostoso com as lutas políticas internas e a inutilidade de sua ação.

Como também estivesse cansado da rarefeita atmosfera boêmia de Londres, Crowley deixou a Inglaterra e começou uma das mais notáveis odisséias deste século. Em menos de dez anos, ele tinha dado duas vezes a volta ao mundo. Ele esteve no México, na Índia, no Ceilão, no Norte da África e na China. Escalou os montes mais altos dos Alpes suíços e italianos. Fez uma excursão ao Himalaia, para escalar o
 

Monte K-2 da Cadeia Chogo-Ri. No início dessas viagens, Crowley tentou ampliar seus conhecimentos mágicos, mas acabou desistindo. Finalmente, comprou uma mansão no Lago Ness, na Escócia, e lá se instalou.
 

Na China, visões de vidas passadas

Crowley se casou e começou a publicar seus livros de poesia – seriam 30, ao todo. Pela primeira vez ele chamava a atenção da imprensa. Um de seus livros de poesia, The White Stains and Alice: an Adultery (As Manchas Brancas e Alice: um Adultério), foi qualificado de pornográfico.

Em 1904, Crowley estava no Cairo. Sua mulher, que jamais demonstrara nenhum interesse especial nos estudos de Crowley sobre o oculto, começou a receber estranhas mensagens. Várias vezes ela levantava-se de noite gritando para Crowley: “Eles estão esperando por você, por que você não vai encontrá-los?” A 8 de abril de 1904, e durante mais dois dias, Crowley ouviu uma voz que lhe ditou inteiro o Liber Al ver Legis (O Livro da Lei), que se tornou o mistério básico da teologia de Crowley. Depois disso ele voltou para a China, passando pela Indonésia e pelo Japão.

Em 1908, na China, o cavalo de Crowley escorregou na beira de um precipício de 75 metros, e caíram os dois lá em baixo. O cavalo morreu na hora, mas Crowley, surpreendentemente, não sofreu um arranhão. Durante a queda, porém, ele teve uma visão: que em outras encarnações ele fora o dr. John Dee, Paracelso e o monge egípcio Ankh-f-n-Khonsu. Viu também que, atualmente, ele era o profeta de uma nova era, cuja bíblia era o Livro da Lei.

Ele retornou à Inglaterra e retirou-se formalmente da Aurora Dourada. Depois, abalou o mundo do ocultismo publicando uma revista chamada Equinox, cujo primeiro número divulgava todos os rituais secretos da Aurora Dourada. Crowley fundou então duas ordens secretas, a Ordo Templi Orientis e a Argenteum Astrum, a Ordem da Estrela de Prata. Em 1911, ele abriu ao público a cerimônia dos Ritos de Elêusis, que causou verdadeira sensação em Londres.

Entre 1908 e 1914, os anos maisprodutivos da vida de crowley, ele deu centenas de conferências e escreveu muitos livros explicando sua filosofia e ensinando os métodos de se atingir uma consciência superior. Alguns desses métodos são simples, outros são aterradores. Por exemplo: para aniquilação do ego, Crowley recomendava que seus discípulos andassem com uma navalha e se cortassem cada vez que pronunciassem o pronome “eu’.’. Ele defendia ainda o uso da droga e a liberdade sexual.

Essas atitudes enfureceram a remanescente imprensa vitoriana. Mas o principal erro de Crowley foi ter apoiado o imperialismo germânico e a causa nacionalista da Irlanda. Ele fez o possível para promover uma aliança entre a Inglaterra e a Alemanha. Durante a guerra propriamente dita, Crowley morou nos Estados Unidos. Quando a Inglaterra declarou guerra à Alemanha, Crowley foi à Estátua da Liberdade e proclamou o Estado Livre da Irlanda. Quando a guerra acabou, Crowley caíra em desgraça na Inglaterra. E a partir daí, as lendas sobre ele, “A Grande Besta”, se espalharam.
 

 

“O homem que queríamos enforcar”

Os grandes responsáveis pela divulgação de uma imagem terrivel de Crowley foram Horatio Bottomley, do jornal John BulI, e James Douglas, do Sunday Express. Foram eles que acusaram – falsamente, ao que tudo indica Crowley de ter assassinado e comido o guia hindu que o acompanhou em sua segunda excursão ao Himalaia. Crowlev, que a essa altura já gastara grande parte de sua fortuna, não tinha mais recursos para processar os jornais.

Em 1920 ele se mudou para a Itália, e em Cefalu, na Sicília, criou um seminário no qual ensinaria sua nova religião. Tudo ia bem quando uma tragédia se abateu sobre o mosteiro: a filha de Crowley e um de seus discipulos, Raoul Loveday, morreram. Crowley não foi responsável por nenhuma dessas duas mortes: Loveday ignorou as várias advertências de Crowley para que não bebesse água não purificada, e acabou morrendo de tifo; e sua filha morreu de influenza. Mas a imprensa deu sua própria versão: Crowley envenenou Loveday, com a intenção de seduzir sua bela e jovem esposa, e sacrificou a própria filha num ritual satânico.

Toda essa pressão levou Mussolini a expulsar Crowley da Itália, em 1922. Ele se tornou então uma espécie de andarilho. Morou na França, na Bélgica, na Alemanha. Em 1926, John Bull publica uma foto de Crowley, com a seguinte manchete: “O homem que queríamos enforcar”.

O ano que marcou definitivamente o início de sua decadência foi 1929. Primeiro, Crowley foi impedido de retornar à França. Depois, não conseguiu encontrar editor para sua recém-acabada autobiografia. E, finalmente, Crowley revelou ao mundo que desde oito anos antes ele era a encarnação do deus Hórus, o que tem cabeça de falcão. Então, nem as ordens secretas que ele fundara o apoiaram.

Crowley estava doente – sofria de flebite e de asma -, tornara-se um viciado em heroína desde que um ferimento muito doloroso na perna o fizera usar a droga, e além de tudo sua fortuna se dissipara inteiramente. Embora fosse viver por mais 17 anos e escrevesse livros importantes como Magick, Teoria e Prática e Magia sem Lágrimas, Crowley caiu no anonimato. Em 1947, morreu na obscuridade e na miséria. Apenas 13 pessoas foram ao seu enterro.

Passados mais de 30 anos de sua morte, as questões acerca de Crowley permanecem quase as mesmas. Ele foi uma fraude, um legítimo paranormal, profeta, santo, deus? Analisar Crowley é como descascar uma cebola: debaixo de uma camada há sempre uma outra, uma outra, uma outra. Que ele possuía uma percepção superior à da maioria dos mortais, não parece haver dúvidas.

Em Retrato de um Artista, o poeta Dylan Thomas conta seu encontro com Crowley. Os dois estavam sentados em bancos opostos, num bar. Dylan Thomas fazia desenhos num guardanapo, que não podiam ser vistos do lugar onde Crowley estava. Crowley começou também a desenhar em seu guardanapo e quando Dylan Thomas se levantou, ele se aproximou e mostrou seus desenhos: eram exatamente iguais aos de Thomas.

O poeta presenciou outro estranho incidente: durante uma ruidosa festa na mansão escocesa de Crowley, dois policiais intervieram para pedir um pouco de silêncio. Atendidos por Crowley, um deles lhe perguntou se era realmente mágico. Crowley disse que sim e começou a rir. Nesse momento, o capacete do policial saiu voando de sua cabeça. Os dois se retiraram absolutamente perplexos.

Crowley foi muita coisa ao mesmo tempo, e como dificilmente deixa de acontecer às pessoas extremamente versáteis, foi um homem contraditório. Reunindo todas as análise, todos os depoimentos que se tem sobre ele e mais toda a sua obra, não se chega a nenhum resultado definido. As pessoas veneraram-no ou então odiaram-no; ninguém nutriu por ele sentimentos intermediários. Somerset Maugham afirmava que Crowley não passava de uma farsante; L. H. Hubbard o considerava um perigoso satanista; G. K. Chesterton o definia como um inofensivo e brilhante excêntrico; Julian Symonds, seu biógrafo, via-o como um sádico viciado em drogas.

E foi ele próprio, Aleister Crowley, que se definiu, em seu epitáfio, da maneira mais misteriosa de todas:

“O Mestre Therion: A Besta 666; Magnos 9-2 da Ordem da Estrela de Prata”, o profeta da Nova Eternidade THELEMA, cujo nome é V.V.V.V.V. na cidade das pirâmides; OLSONUF VAORESAGI na Montanha de Abiegnus; Perdurabo na ordem superior da Estrela de Prata; e no Mundo dos Homens na Terra, Aleister Crowley de Cambridge.”
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Revista Planeta
Número 85
Outubro de 1979

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Textos escritos ou selecionados por: Zelinda Orlandi Hypolito
ze666Psicóloga clínica com especialidade em regressão de memória;
em PKZ – Psyckorszem – A Reconciliação entre os corpos físico/emocional/mental;
e terapia de DBITP (Dessensibilização Progressiva de Incidentes Traumáticos Primários).


Criadora do Workshop: Despertar da Bruxa.
Fundadora do Instituto de Pesquisas Psíquicas Imagick.
e Pontifex Solaris do IIE (Imagicklan – a Irmandade das Estrelas)
Vice-Presidente do Instituto de Pesquisas Psíquicas Imagick;
Coordenadora de todas as atividades da Cidade das Estrelas;
Criadora de todos os cursos regulares promovidos por esta entidade.
Telefones: (0xx) (11) 3031.3076 – Celular: (11) 962333.1777