Platão
(427 AC, Agina – 347, Grecia)
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Platao 1Platão nasceu na primavera do ano 427 AC, na ilha de Agina, perto de Atenas.
 
   Filosoficamente falando, podemos dizer que, tanto ele, como Sócrates (de quem foi discípulo), são nossos contemporâneos, pois, da mesma maneira como nós assistimos o fim da chamada “civilização cristã” (que nada mais tem de cristianismo), eles presenciaram o fim da civilização grega.

  Platão, passou parte de sua juventude servindo ao exército ateniense. Depois dedicou-se ao estudo. Foi quando sentiu a pressão dos governantes tiranos, da corrupção desenfreada dos políticos, da sensualidade desmedida que cegava os homens, da censura impiedosa que calava a boca da juventude. Mas, quando viu a execução de seu mestre, Sócrates (acusado de corromper as idéias dos jovens com sua filosofia renovadora), ele, envergonhado, deixou o solo grego, indo viver no Egito, em Cirene (Líbia) e na Magna Grécia.     platao 3
Lá pelos idos de 387 AC, ele retornou à Grécia onde fundou um centro educacional que recebeu o nome  de “ACADEMIA”. Este local foi projetado para ser uma universidade, isto é, uma pequena réplica do universo. Foi apenas depois dela que Platão pôde ver mais claramente que as suas idéias poderiam criar um novo sistema filosófico.
     Platão trabalhou em sua escola durante os últimos 20 anos de sua vida estudando, pesquisando, discutindo, escrevendo e investigando. Seus derradeiros diálogos são muito mais técnicos e analíticos que os de sua juventude.

    Quando morreu, aos 80 anos,  Platão ainda trabalhava duro na sua obra: “As Leis”. Um monumental  detalhado código jurídico que deveria servir de modelo para todas as cidades da época.

     Sobre Platão e sua personalidade, pouco se sabe e nada pode ser deduzido através de seus escritos.

    A doutrina platônica traz a herança de Sócrates e sofre uma forte influência de Pitágoras. Considera que a busca da verdade está relacionada com a salvação da própria alma. Para ela, os objetos da percepção sensível não são reais e que os objetos do pensamento (os números) são a única realidade.

      A Academia continuou funcionando, sob diferentes disfarces, durante séculos, depois da morte de Platão.

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O MITO DA CAVERNA

Extraído de “A República” de Platão . 6° ed. Ed. Atena, 1956, p. 287-291

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platao2PSÓCRATES – Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à ciência e à ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre à luz em toda extensão. 
Aí, desde a infância, têm os homens o pescoço e as pernas presos de modo que permanecem imóveis e só veem os objetos que lhes estão diante. Presos pelas cadeias, não podem voltar o rosto. 

Atrás deles, a certa distância e altura, um fogo cuja luz os alumia; entre o fogo e os cativos imagina um caminho escarpado, ao longo do qual um pequeno muro parecido com os tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os espectadores para ocultar-lhes as molas dos bonecos maravilhosos que lhes exibem.

GLAUCO – Imagino tudo isso.

SÓCRATES – Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro, com figuras e objetos que se elevam acima dele, figuras de homens e animais de toda a espécie, talhados em pedra ou madeira. Entre os que carregam tais objetos, uns se entretêm em conversa, outros guardam em silêncio.

GLAUCO – Similar quadro e não menos singulares cativos!

SÓCRATES – Pois são nossa imagem perfeita. Mas, dize-me: assim colocados, poderão ver de si mesmos e de seus companheiros algo mais que as sombras projetadas, à claridade do fogo, na parede que lhes fica fronteira?

GLAUCO – Não, uma vez que são forçados a ter imóveis a cabeça durante toda a vida.

SÓCRATES – E dos objetos que lhes ficam por detrás, poderão ver outra coisa que não as sombras?

GLAUCO – Não.

SÓCRATES – Ora, supondo-se que pudessem conversar, não te parece que, ao falar das sombras que veem, lhes dariam os nomes que elas representam?

GLAUCO – Sem dúvida.

SÓCRATES – E, se, no fundo da caverna, um eco lhes repetisse as palavras dos que passam, não julgariam certo que os sons fossem articulados pelas sombras dos objetos?

GLAUCO – Claro que sim.

SÓCRATES – Em suma, não creriam que houvesse nada de real e verdadeiro fora das figuras que desfilaram.

GLAUCO – Necessariamente.

SÓCRATES – Vejamos agora o que aconteceria, se se livrassem a um tempo das cadeias e do erro em que laboravam. Imaginemos um destes cativos desatado, obrigado a levantar-se de repente, a volver a cabeça, a andar, a olhar firmemente para a luz. Não poderia fazer tudo isso sem grande pena; a luz, sobre ser-lhe dolorosa, o deslumbraria, impedindo-lhe de discernir os objetos cuja sombra antes via.

Que te parece agora que ele responderia a quem lhe dissesse que até então só havia visto fantasmas, porém que agora, mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, via com mais perfeição? Supõe agora que, apontando-lhe alguém as figuras que lhe desfilavam ante os olhos, o obrigasse a dizer o que eram. Não te parece que, na sua grande confusão, se persuadiria de que o que antes via era mais real e verdadeiro que os objetos ora contemplados?

GLAUCO – Sem dúvida nenhuma.

platao1SÓCRATES – Obrigado a fitar o fogo, não desviaria os olhos doloridos para as sombras que poderia ver sem dor? Não as consideraria realmente mais visíveis que os objetos ora mostrados?

GLAUCO – Certamente.

SÓCRATES – Se o tirassem depois dali, fazendo-o subir pelo caminho áspero e escarpado, para só o liberar quando estivesse lá fora, à plena luz do sol, não é de crer que daria gritos lamentosos e brados de cólera? Chegando à luz do dia, olhos deslumbrados pelo esplendor ambiente, ser-lhe ia possível discernir os objetos que o comum dos homens tem por serem reais?

GLAUCO – A princípio nada veria.

SÓCRATES – Precisaria de algum tempo para se afazer à claridade da região superior. Primeiramente, só discerniria bem as sombras, depois, as imagens dos homens e outros seres refletidos nas águas; finalmente erguendo os olhos para a lua e as estrelas, contemplaria mais facilmente os astros da noite que o pleno resplendor do dia.

GLAUCO – Não há dúvida.

SÓCRATES – Mas, ao cabo de tudo, estaria, decerto, em estado de ver o próprio sol, primeiro refletido na água e nos outros objetos, depois visto em si mesmo e no seu próprio lugar, tal qual é.

GLAUCO – Fora de dúvida.

SÓCRATES – Refletindo depois sobre a natureza deste astro, compreenderia que é o que produz as estações e o ano, o que tudo governa no mundo visível e, de certo modo, a causa de tudo o que ele e seus companheiros viam na caverna.

GLAUCO – É claro que gradualmente chegaria a todas essas conclusões.

SÓCRATES – Recordando-se então de sua primeira morada, de seus companheiros de escravidão e da idéia que lá se tinha da sabedoria, não se daria os parabéns pela mudança sofrida, lamentando ao mesmo tempo a sorte dos que lá ficaram?

GLAUCO – Evidentemente.

SÓCRATES – Se na caverna houvesse elogios, honras e recompensas para quem melhor e mais prontamente distinguisse a sombra dos objetos, que se recordasse com mais precisão dos que precediam, seguiam ou marchavam juntos, sendo, por isso mesmo, o mais hábil em lhes predizer a aparição, cuidas que o homem de que falamos tivesse inveja dos que no cativeiro eram os mais poderosos e honrados? Não preferiria mil vezes, como o herói de Homero, levar a vida de um pobre lavrador e sofrer tudo no mundo a voltar às primeiras ilusões e viver a vida que antes vivia?

GLAUCO – Não há dúvida de que suportaria toda a espécie de sofrimentos de preferência a viver da maneira antiga.

SÓCRATES – Atenção ainda para este ponto. Supõe que nosso homem volte ainda para a caverna e vá assentar-se em seu primitivo lugar. Nesta passagem súbita da pura luz à obscuridade, não lhe ficariam os olhos como submersos em trevas?

GLAUCO – Certamente.

platao 4SÓCRATES – Se, enquanto tivesse a vista confusa — porque bastante tempo se passaria antes que os olhos se afizessem de novo à obscuridade — tivesse ele de dar opinião sobre as sombras e a este respeito entrasse em discussão com os companheiros ainda presos em cadeias, não é certo que os faria rir? Não lhe diriam que, por ter subido à região superior, cegara, que não valera a pena o esforço, e que assim, se alguém quisesse fazer com eles o mesmo e dar-lhes a liberdade, mereceria ser agarrado e morto?

GLAUCO – Por certo que o fariam.

SÓCRATES – Pois agora, meu caro GLAUCO, é só aplicar com toda a exatidão esta imagem da caverna a tudo o que antes havíamos dito. O antro subterrâneo é o mundo visível. O fogo que o ilumina é a luz do sol. O cativo que sobe à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo inteligível. Ou, antes, já que o queres saber, é este, pelo menos, o meu modo de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro. Quanto à mim, a coisa é como passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo inteligível está a idéia do bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer, mas que, conhecida, se impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo e bom, criadora da luz e do sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos fixos para agir com sabedoria nos negócios particulares e públicos.

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“Platão O Iniciado”

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Platão nasceu na primavera  do ano 427 AC, na ilha de Agina,  perto de Atenas. 
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  imageQ92 Mais do que um filósofo, Platão era um grande iniciado em ciências ocultas. 
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Isto ficou demonstrado em todos os seus escritos. 
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Neste artigo, faz-se um levantamento das muitas teorias e crenças de Platão, retiradas principalmente dos Diálogos. 
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A existência da Atlântida, o conhecimento alquímico, a influência do culto solar, noções de cabala, analogias com a ioga em muitos ensinamentos, os problemas do outro mundo, a vida depois da morte, são algumas questões analisadas e demonstradas.
Estendia-se a Atlântida desde o golfo  de Cadiz, além das colunas de Hércules, por uma superfície aproximada de 6 milhões de estádios (cerca de 2 mil quilômetros quadrados) –  e era constituída predominantemente por uma planície oblonga de cerca de 1890 quilômetros quadrados de área, sendo cercada por um maciço montanhoso e por barreiras arrecíficas que a protegiam dos ventos do norte.
 Todos os metais duros e maleáveis existiam em suas minas, entre eles o oreikalkos, o mais precioso dentre eles, após o ouro. Sua natureza foi muito discutida, tendo muitos feito boas aproximações. A titulo de exemplo, citaremos Filopon, que em seus comentários às Analíticas de Aristóteles, o identificou ao cobre branco, isto é, ao latão. E muitos outros o fizeram, mesmo os autores de livros de alquimia, como o atesta Marcellin Berthelot em seu livro “A Química na Idade Média”. Todavia, todos se enganavam; o oreikalkos é apenas e tão somente o mercúrio filosófico no seu estado de fixidez, isto é, a docilidade metálica obtida pela ação de Vulcano lunático (o fogo sutil); o caráter metálico em seu aspecto feminino.
 
Tenha-se em mente que o oreikalkos do Crítias não é uma liga; é metal simples, e não se parece com o latão, pois tem reflexos do fogo. Seus templos eram enriquecidos por todos os metais preciosos; nas montanhas, muitas vilas, ricas em habitantes, rios, lagos, e prados, capazes de nutrir animais selvagens e domésticos, florestas de grande porte que propiciavam material abundante para todos os tipos de trabalho. Reis sábios a governavam em dez Estados, criados por Posseidon, e mantinham a lei desse deus de acordo com o juramento prestado no seu templo, e de um ritual, repetido a cada cinco ou seis anos, de forma a alternar anos pares e ímpares, para alcançar um perfeito equilíbrio, que lançava os mais terríveis anátemas contra os perjuros. Um verdadeiro e notável culto solar.
 

Toda essa riqueza era defendida pela sabedoria e prudência e por forças imensas estimadas em cerca de um milhão e duzentos mil homens, bem como 10 mil carros e 1 200 navios. 

Há 12 mil anos, este povo entrou em guerra com os habitantes do mar Mediterrâneo, onde possuía possessões, como por exemplo o Egito, e foi derrotado, pois sua força principal, que residia na virtude e no cumprimento das leis do deus, havia sido perdida, e Zeus desejou punir o seu orgulho e prepotência. 

  

  
As provas da Atlântida
 

Esta narrativa, que resumimos do Crítias de Platão, parece ter como únicas precursoras as de Hecateu e de seu imitador, Heródoto, e verifica-se a existência de alguns textos derivados, como o de Proclo. Foi e é essa narrativa alvo de muita discussão. 

 

 Mas, com certeza, a Atlântida existiu e podemos indicar com segurança alguns pontos em que a passagem de seus habitantes é atestada: nas ilhas Canárias, onde verificamos a presença de caracteres de uma língua pré-semítica e pré-indoeuropéia, onde na chegada dos espanhóis, o povo dos guanches que as habitavam, assustou-se, pois acreditava-se o único remanescente da humanidade dizimada pelo dilúvio; nas ilhas da Madeira, Porto Santo, Formigas, Santa Maria, do delta do Nilo até Villa Cisneros  e segundo tudo indica, por ocasião do grande cataclismo que fez com que a ilha desaparecesse e se transformasse num amontoado de lama, que impedia a navegação, há 9 mil anos, no grande mar, vieram ter, de alguma maneira, às Antilhas, e daí à América Central, pela região de Belige. 
Pelas ilhas de Barlavento teriam chegado a Trinidad, e daí à América do Sul. Uma hipótese bastante sedutora, porém arriscada, pode ser levantada: teriam tido, aí, contato com as civilizações dos astecas, maias e rocas. A interação com culturas heterogêneas é bastante evidente nestes povos.
 

Poderíamos ainda dizer que a miscigenação com homens brancos já era fato notório quando os portugueses aqui chegaram; índios com olhos azuis eram comuns entre os guaranis, e a ciência de curar deste povo, e mesmo as narrativas de contos infantis atestam objetivamente a similaridade com a mitologia dos egípcios e dos gregos – a velha crença de todos os povos – com seus inúmeros dilúvios e deuses irados com os erros dos homens. E isto, todavia, apenas e ainda no domínio da hipótese pela descrença exacerbada que se arraiga no nosso insensato orgulho.
 

Todavia, o essencial permanece.

 

 
 Os segredos do Timeu
 

Rafael Sanzio, em seu afresco “A Escola de Atenas”, figurou o velho sábio Platão portando o Timeu entre suas mãos, e os artistas bizantinos e iluministas o representavam de forma idêntica. Alexandrinos e ecléticos votavam a este livro um culto tão particular que nossa curiosidade foi despertada, e mais sobressaltada ficou quando soubemos que os sábios cristãos, árabes e judeus ativeram-se a esse livro com o mesmo ardor com que veneravam os livros canônicos. Evidentemente, não faremos a exposição de todo o Timeu, não seria adequado, e mais, apenas a leitura e meditação consciente desse obscuro livro da Antiguidade poderão levar ao conhecimento que o mesmo visa a propiciar.
 

A escola de Chartres tentou durante muito tempo conciliar as indicações do Timeu relativamente ao nascimento do universo, com os textos do Gênesis. Os sábios medievais, pensando em uma síntese definitiva, acreditaram ter como modelo o Timeu; os renascentistas procuraram descobrir o sentido oculto das passagens relativas à alma do mundo. Mais uma vez foram enganados. A alma do mundo atraiu a atenção de todos, agora, o realmente importante e principal é o que foi dito relativamente ao humano, tudo o que foi escrito introduz e anuncia este tema, o anterior a ele, o humano, é apenas uma grande ouverture. 

 

 

 
Entretanto, que abertura! Uma doutrina em que se entrevê o esforço calmo (e desesperado, apesar disso) para atingir, além das aparências, a imutável realidade; descrever o mundo, para Platão, é descrever aquilo que muda, escapar ao domínio das verdades imutáveis e obrigar-se a considerar um princípio irredutivel de confusão e desordem.

 O Timeu é uma contínua aplicação da teoria das formas, não se tendo uma nítida visão da teoria das idéias que lhe é subjacente, como acontece na República e no Sofista.
 

Estes aspectos são tratados sobejamente nos manuais de filosofia, que deixam escapar pelas malhas de sua grosseira rede (o mesmo para as mais finas ? e ainda assim grosseiras – dos especialistas) o aspecto nitidamente iniciático que esse livro contém.
 

Paira acima de qualquer dúvida, na Grécia clássica, possuir o estudo um caráter de iniciação, onde o versado, através de uma linguagem metafórica, e por vezes velada, comunicava aos iniciandos as desvelações que obtivera, e as revelações que o conhecimento lhe proporcionava.
 

Platão viajou pelo Egito, e isto é atestado pelo testemunho de Diógenes Laércio e pelas idéias que professa no Timeu, pois a matemática que nele apresenta, apesar do delineamento pitagórico, é nitidamente egípcia, como se pode constatar pela sua comparação com a estereometria do papiro de Rind (1100 a.C.). 

A influência do culto solar de Heliópolis (cidade do Baixo Egito, hoje com ruínas, perto do Cairo. Célebre pela mais antiga compilação do Livro dos Mortos: a recensão heliopolitana, pois foi composta pelos sacerdotes de On (Heliópolis), é bastante marcada através da forma com que o sábio constrói a sua cosmologia; a sua teoria das idéias parece fazer parte da iniciação cabalística que se prende ao culto de Isis em Heliópolis, e ao de Ra em Rere (centro religioso do antigo Egito. 

 Também é o nome de um ser divino mencionado na recensão tebana do Livro dos Mortos.); mais ainda, Platão associa Ra com a Justiça, pois Radamante (juiz do Ocidente, que com Minos e Éaco, do Oriente, era encarregado de receber e julgar os mortos, segundo a tradição grega); pode ser transformado, pela cabala fonética, em Ra, Amentet Ra do outro mundo, julgador dos mortos.
 

A sua afirmação de que Deus, querendo criar imitação móvel da eternidade, cria, segundo a lei dos números, aquilo a que chamamos tempo e mais, ao afirmar que “o futuro é o futuro, ou ainda: o não-ser é o não-ser, todas essas expressões nunca são exatas”, torna-se de surpreendente modernidade, aproximando-se muito dos nossos conceitos atuais. E se estivermos corretos, muitas de suas investigações possibilitam o surgimento de uma teoria física totalmente nova e em perfeita concordância com a hoje existente.
 

Conceito de espaço
 

Algumas concepções platônicas aproximam-se, quanto ao aspecto formal, tão intensamente do nosso moderno conhecimento que por vezes, aturdidos, acreditamos estar cometendo anacronismos gritantes na sua leitura, e entretanto é inegável que afirme a perturbação geométrica do espaço em torno de um objeto material; que o movimento se processa no espaço e sob a forma de turbilhão.
 

Todavia, é conveniente explicitar que o conceito de espaço, de Platão, é o seguinte: “espaço é aquilo em que se desenvolve o que nasce”; mais precisamente: “a porção desta realidade que é inflamada e parece chama, a parte umidificada, parecendo e contendo elemento úmido, e parecendo terra ou ar, segundo a proporção na qual receba as imagens da terra ou do ar”.
 

esta forma, o mestre exclui o inexistente, o não-ser, afastando-se de Leucipo e Demócrito, e aproximando-se de Parmênides, isto todavia na aparência, pois em verdade atribui ao espaço as mesmas características do não-ser. E não se estabelece nenhuma confusão do Ser Absoluto com o espaço, pois o primeiro não é interpenetrado nem interpenetra nenhum outro corpo; enquanto o segundo tem a sua existência assegurada pela interpenetração. Aqui se estabelece um momento único da tradição e da cosmogonia alquímica.
 

Os corpúsculos de Platão (átomos) não são inalteráveis, e se desgastam em suas arestas, contrariamente à teoria atômica de Demócrito, e são suscetíveis de mudar suas formas através de pertinentes mudanças do meio. Em Demócrito, objetiva-se uma visão quantitativa da matéria; em Platão, uma acepção qualitativa é renitentemente defendida. 

A forma dos átomos determina a natureza da matéria; uma alteração da geometria da mesma obriga uma transmutação da matéria. Todo o existente no mundo é formado por quatro elementos: terra, água, fogo, e ar, que têm suas formas respectivamente asseguradas e determinadas: o tetraedro ou pirâmide é a figura elementar do fogo o octaedro, a do ar; o icosaedro, da água, e o cubo, a da terra.

 A sua cosmogonia, em linguagem alquímica, poderia ser narrada da seguinte forma (em consonância com as adaptações ao Gênesis): Deus criara a matéria primeira, terrível obscuridade, função pontualmente determinada, caos-potencialmente-tudo. Água primitiva de que falam as escrituras. A luz emanada de Deus atingiu em forma de palavra essa “água” primitiva e conformou com ela o padrão potencial de tudo o que há no mundo.
 

O Verbo, atuando sobre este caos, separou o sutil do espesso; e assim, pelo calor e luz divinos, separou-se da massa, sutil e celeste substância que continha três partes de luz para uma de matéria, migrou e formou o corpo dos anjos, a esfera empírea, e depois o corpo do Sol e corpos celestes. Depois, outra parte sutil, porém menos, o “binarius”: duas partes de luz para três de matéria, que formou os corpos interestelares. Então surgiu o “ternarius”: meio onde o alquimista e o mago trabalham, onde o possível é antes de tudo real, constituído poruma parte de luz para três de matéria. Neste ar reside o segredo de todas as coisas ditas ocultas.
 

Após a extração desses corpos sutis, a massa residual restringia-se a terra e água, que continha cada uma delas um pouco de luz. A água, princípio de liquidez, de umidade mórbida e geradora, é mais sutil que a terra, pois pode elevar-se como vapor e depositar-se como rocio, é o liame entre o espírito e a matéria; a terra, receptora de influências. O fogo não é tratado como fogo, mas sim como atividade, é o úmido fogo lumínico. Cada um dos quatro elementos é dividido em três, de forma a permitic a mudança e atendimento das variações dos corpos espirituais ativos. A determinação do que se irá gerar é função do demiurgo que tem o caráter de uma causa ativa.
 

As funções da alma
 

Esta cosmogonia é de autoria de um grupo de monofisitas (doutrina dos que só reconhecem uma natureza em Jesus Cristo, e portanto, a do universo. Fundada por Eutíquio em 451 a.D., foi condenada pelo Concílio de Calcedônia. Consta hoje de três igrejas independentes: a igreja armênia; a jacobita, da Síria e a copia, do Egito), de cerca de 480 a.D., e notamos a sua perfeita consonância com as teorias platónicas, que, segundo tudo indica, são o fundamento da mesma, com a única diferença de que a terra não possui nessas concepções, subespécies, variando tão somente as quantidades de fogo e de água que possui.
 

Mas o fundamental é o que se refere ao humano, repetimos.
 

As funções, que atribui à alma, são essencialmente o princípio da vida, isto é, de movimentos ordenados rumo a uma coerência. O Timeu distingue quatro almas diferentes: a “alma imortal do animal mortal”, que determina inclusive a forma do corpo que lhe serve de veículo, que é na alma humana, totalmente semelhante à alma do mundo, esférica como ela e comporta dois círculos do mesmo e um do outro (a igualdade e a diversidade), que tem suas revoluções, que podem ser perturbadas pela ação de objetos exteriores, pois a torrente da alimentação e dos sentidos afeta constantemente esse chakra, o sahasrara, a mente mais alta e intuitiva, que tem sua sede na cabeça, e responsável pela posição ereta do corpo humano.
 

As outras almas distribuem-se abaixo do pescoço.. A primeira situa-se na direção do tórax, o anahata, o chakra do vital superior, sede das emoções.
 

Sob o diafragma localiza Platão a alma responsável pela alimentação, que identificamos ao chakra nabhipadma, responsável pelas paixões e movimentos dos desejos; finalmente, ainda mais abaixo, na região dos intestinos, onde nenhuma força psíquica parece agir, centraliza á quarta alma, “o amor da conjunção carnal”, o svadhisthana, que dirige também a avidez e a sensualidade.
 

Todavia, contrariamente ao que se acredita, o iniciado não condena o desenvolvimento dos chakras, melhor, das almas inferiores, antes propugna pelo desenvolvimento coerente e harmônico de todas as almas, a fim de que não morramos de morte pela nossa preguiça.
 

As analogias com a ioga são gritantes, e se acreditamos que os fenícios, egípcios e hindus tenham transmitido parte de seu conhecimento astronómico aos gregos, devemos ou podemos acreditar que os mistérios de Elêusis, assim como os Órficos, em que Prosérpina e Ceres orientais eram veneradas, e os mistérios transmitidos aos iniciandos (Platão foi um dos maiores) tivessem como a ioga, a ponto de fazer com que a caityapurusa (designação da alma como a personificação da consciência divina no homem) fosse tomada como tema pelo mesmo para a concepção do brahmand (universo; o ovo de Brahma). Para Platão, todo o conhecimento é um caminho, toda aparência uma via para a essência, toda a vida uma ioga.
 

A ciência oculta
 

Essas indicações concordam com todos os ensinamentos fornecidos pelo Fedon (que examinaremos mais detidamente), Fedro e a República, que, contrariamente ao Timeu, tratam tão somente da parte imortal da alma, mas o décimo Livro das Leis admite, como o Timeu, que a alma é mais velha que o corpo e, portanto, implicita-lhe nascimento. Ora, o Fedon, o Fedro, a República implicam a eternidade das almas para poderem justificar a reminiscência e o Fedro acresce que sua encarnação é fruto da punição de uma falta, donde concluímos que devemos separar decididamente a alma esférica que se aloja no cérebro e que congloba o sahasrara (a mente intuitiva) e o ajnacakra (centro da vontade) que é imortal, das demais que refletem apenas impulsos carnais.
 

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A sua anatomia apresenta certas confusões, que nos espantam, tendo em vista que os sábios anteriores a Platão conheciam, muito melhor que a sua descrição, os mecanismos anatómicos.  
  Entretanto algumas de suas afirmativas nada têm a ver com o que usualmente se entende por anatomia; sua teoria da respiração, por exemplo, explica, sensivelmente melhor que as modernas, o fato de respirarmos por apenas uma narina em ciclos alternados.

Sua patologia e mesmo sua terapêutica parecem rudimentares, tendo-se em vista os textos hipocráticos e se nos ativermos apenas ao sentido das palavras em sua atualidade, mas o fato é que esse conhecimento remonta à muitos anos antes de Hipócrates e mesmo de qualquer outro grego, é muito anterior à chegada dos jônios e dórios aos Bálcãs, remonta ao conhecimento curativo dos padres egípcios em sua sede de Rere, com o conhecimento perfeito e a possessão de Schem-ha-mephohasch – a palavra perdida e reencontrada pelos seguidores da Kaballah.
 

Esta ciência oculta e mesmo interdita foi transmitida aos nossos dias através de lendas, narrativas e livros como o Timeu e o Tarô, e permanece esperando que alguém se lance à pesquisa e desvele-a, esquecendo totalmente as tolas pretensões de rigor que são apenas um dos muitos frutos do irracional medo de perder a razão.
 

O Fedon está salpicado de elementos que, superficialmente fortuitos, têm tal imagem apenas para desviar a atenção dos que são desprovidos de ouvidos para ouvir. 

As frases iniciais trocadas entre Fedon e Equecrates nos apontam os seguintes fatos – ambos pertenciam ao círculo pitagórico da cidade de Flio, que era uma seita iniciática com base no culto órfico; o adiamento da execução de Sócrates, em respeito à peregrinação a Delos, com relação à estória de Teseu e o Minotauro… 

 ….e como voto dos atenienses a Apolo e Artemis, é indicativo seguro de que Sócrates parte para a verdadeira vida após a vitória sobre o mundo material.
 

 A viagem de navio e suspensão da pena de morte indicam no esoterismo egípcio a transição sutil para a vida além deste mundo, a segunda vida.
 

A passagem pelos mistérios
 

A curta dissertação de Sócrates relativamente à dor e ao prazer sugere á dissolução das dualidades, o alvo do espírito.
 

Os mistérios órficos, a exemplo do Menon, são invocados para justificar o fato de não se dever desejar a morte; sendo os homens submetidos ao céu, não cabe à humanidade o poder da vida e da morte, mas sim aos deuses, pois quando uma pessoa se dedica à filosofia no sentido correto da palavra, os demais ignoram que sua única ocupação consiste em preparar?se para morrer e estar morto. 

No antigo Egito, na recensão dos sacerdotes de Heliópolis, o Livro dos Mortos prescreve um caminho preparatório da morte e um caminho seguro para Re-stau (corredores e passagens da tumba e do submundo, a porta para o verdadeiro mundo), a rota segura da dupla Maat (nome de uma localidade, a passagem pelos mistérios) e da transformação em Osíris. “Curiosamente”, a exemplo do Fedon, ou talvez de onde o Fedon toma exemplo, o livro leva em conta apenas os fatos da outra vida, considerando por pressuposto a grosseria e falta de objetividade deste mundo.   

  

 A autodisciplina órfica e mesmo do processo de Elêusis é mais uma vez lembrada ao se falar do aumento da concentração da alma e do corpo sutil através de um “refluxo vindo de todas as partes do corpo”.
 

O próprio pensamento como instrumento temporário do caminho de cada um, pois pensamos através do cérebro; num estágio posterior, o mesmo se consome, pois a velha ferramenta e sua emanação – o pensamento – são substituídos pelas expressões superiores do ser humano, porque “o divino se dá àqueles que se dão sem reservas e em todas as suas partes ao divino. Para eles, a calma, a luz, o poder, a alegria, a liberdade, a amplidão, as alturas do conhecimento, os mares de ananda (felicidade divina, ou espiritual), no dizer de Sri Aurobindo. 

Ou como se dizia: “Numerosos são os bacantes, mas poucos os portadores de tirso”; muitos se apinham para ver o jogo, mas poucos são os jogadores.  No mito e no culto é que têm origem todas as grandes forças instintivas da vida civilizada: o direito e a ordem, o comércio e o lucro; a indústria e a arte; a poesia; a sabedoria e a ciência. 

 Todas com suas raízes profundamente cravadas no jogo que só se torna pensável e possível quando a presença do espírito destrói o determinismo absoluto do cosmo. A própria presença do jogo é uma confirmação permanente da natureza supralógica da condição humana. E assim jogamos nosso destino num maniqueísmo fútil e involuntário, em que o tigre caça o tigre que tem uma listra a menos, e nos esquecemos de nossa verdadeira problemática. Restringimo?nos a perquirições abstrusas, sem nenhum sentido, uma vez que olvidam o humano, dissipamos nossos esforços em espera inútil e compungidamente olhamos nossos antepassados como meros homens com ciência e cultura inferiores. . .
 

O problema do outro mundo
 

“Tomemos o cuidado para que não venha a penetrar em nossas almas o pensamento de que nossos argumentos nada tenham de razoável. Suponhamos ao contrário que nós é que ainda não temos bastante discernimento.”
 
 

O problema do outro mundo se reforça mais uma vez, e questões geográficas do outro lado da vida, ou da mente, são discutidas com naturalidade surpreendente: “Assim, dizem que o mesmo gênio, que acompanhava a cada um de nós durante sua vida, é quem conduz cada morto a um determinado lugar; imposta a sentença, são levados ao Hades, conduzidos por um guia a quem foi dada a ordem de levá-los para lá. 

 

 

 Depois de haverem recebido o que mereciam, um outro os reconduz para cá, através de muitos e demorados períodos de tempo. O que quer dizer que o caminho não é tal como o pretende o Télefo, de Ésquilo (uma das obras de Ésquilo refere-se a Télefo, rei da Misia, que, ferido pela lança de Aquiles, curou?-se com a ferrugem da mesma. Utiliza-se esta circunstância para designar um mal que traga consigo o seu próprio antídoto): o caminho que conduz ao Hades não é único, nem simples, pois se assim fosse, não necessitaríamos de um guia para não errar a direção. Desta maneira, a alma ordenada e sábia acompanha obedientemente o guia, pois bem conhece a situação. Mas a alma que se agarra avidamente ao corpo e oferece resistência, uma vez chegada ao seu lugar, é evitada pelas outras almas e, em virtude de uma necessidade fatal, é levada a uma residência que lhe é conveniente”.
 

Desejamos ressaltar que a descrição aqui feita é muito semelhante à que se verifica no Bardo Todol, o livro tibetano dos mortos, pois apenas é necessário para o encontro com a clara luz primordial, o Darma Caia, que se tenha sabido cultivar a verdadeira sabedoria neste mundo em que vivemos. 

 

A descrição que Sócrates estabelece entre a terra e a verdadeira terra parece ter colaborado definitivamente para as teorias de uma terra oca, que foram desenvolvidas durante a vigência do III Reich. 
  Não obstante, o passado nos é sombra e mistério, e o poema The Human Abstract, de William Blake, reencontra sua essência. 

  Relembremo-nos ainda do Górgias platônico: “Porque é vergonhoso que, estando na situação em que agora parecemos estar de uma forma evidente, tenhamos muito embora a pretensão de crer que somos algo, nós. que nunca temos certeza, e a mesma opinião acerca das mesmas coisas e questões, e o que é pior, acerca de questões de suma importância: tal é o grau de ignorância em que nos encontramos”.

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