chico21Francisco Cândido Xavier

(1910 em Pedro Leopoldo – 2002 em Uberaba)

 

Francisco Cândido Xavier nasceu em Pedro Leopoldo, cidadezinha próxima de Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, em 2 de abril de 1910. João Cândido, seu pai, tinha temperamento de artista, gostava de serenatas ao som do violão, foi cambista de bilhetes de loteria, homem pobre de prole numerosa.

 

Sua mãe, Maria João de Deus, filha de lavadeira humilde de Santa Luzia do Rio das Velhas era neta de índia, a avó Senhorinha, e reconhecida por sua bondade natural.

 

A matriz genética mais característica do povo brasileiro — a do ameríndio, do português e do negro — está presente na base corpórea de Chico Xavier, esse homem simples das Minas Gerais.

           

Desde a primeira infância, fatos insólitos aconteciam em sua vida: aos quatro anos repetiu aos pais os ensinamentos que lhe eram ditados pelos espíritos a respeito de problemas de saúde de uma vizinha e depois do falecimento de sua mãe, ocorrido a 29 de setembro de 1915, passou a vê-la e a conversar com ela.

 

Os fenômenos, que ocorriam de forma tão natural e constante em sua vida, eram rechaçados invariavelmente por aqueles que o cercavam, uma vez que a pequena Pedro Leopoldo, como toda cidade mineira, estava impregnada do catolicismo do inicio do século. Isso, como é natural, criou conflitos psicológicos muito grandes para o menino ingênuo.

 

Se contava que havia visto a mãe e conversado com ela, apanhava ainda mais da madrinha — a mulher perturbada sob cuja guarda ficou durante mais de dois anos, após a morte de sua mãe — e que o surrava normalmente três vezes ao dia, sem perdão de um único dia da semana, além de outras sevícias.

 

Suas visões e conversas com os seres de outro mundo pontilharam sua vida escolar — ele conseguiu fazer somente o curso primário —, suas visitas à igreja católica, hábito no qual foi educado por sua mãe, e também seu trabalho. Sebastião Scarzelli, seu padre confessor, passava-lhe penitências a fim de livrá-lo dos demônios, mas as aparições continuavam.

 

Antes de completar nove anos, trabalhou na fábrica de tecidos para auxiliar no sustento da casa. Cidália, a segunda esposa de seu pai, anjo de bondade em suas vidas, tivera mais seis filhos; ao todo, seu João Cândido foi pai de 15.

 

Desde cedo, Chico esqueceu-se de si próprio para auxiliar no sustento e educação dos irmãos. Caiu doente dos pulmões com o trabalho da tecelagem, passou, então, a auxiliar de cozinha no Bar do Dove, depois, por alguns anos, foi caixeiro de um pequeno armazém de propriedade do Sr. José Felizardo Sobrinho e, finalmente, aos 23 anos, entrou para o Ministério de Agricultura, prestando serviço à Fazenda Modelo de sua cidade, aposentando-se, após 35 anos de trabalho, já em Uberaba, sem nunca ter tirado férias ou faltado ao serviço, no cargo de escriturário.

Os fundadores do Imagick com Chico Xavier em março 1969

image612Em maio de 1927, Maria Xavier, irmã de Chico, apresentou distúrbios psíquicos que não foram solucionados pela Medicina. A família pediu, então, o auxilio do Sr. José Hermínio Perácio e sua esposa Carmem, espíritas convictos, que trataram da jovem, acometida de obsessão, em seu próprio lar, reintegrando-a, depois, à vida familiar, devidamente equilibrada e com a orientação espírita.

 

Com esse fato, Chico Xavier convenceu-se da realidade do Espiritismo e reuniu um grupo de crentes para o estudo e difusão da Doutrina. Foi nessas reuniões iniciais que ele se desenvolveu como médium escrevente, semimecânico.

 

No dia 8 de julho de 1927, recebeu as primeiras páginas psicografadas de autoria de um espírito amigo, em uma reunião do Centro Espírita Luiz Gonzaga, que funcionava na residência de seu irmão, José Xavier. Desde então, até os dias de hoje, 69 anos depois, ele tem sido a extraordinária antena psíquica do século XX, recebendo páginas literárias, cientificas, evangélicas e consoladoras de mais de 600 autores, com 397 livros publicados até o momento (março/96).

 

Foi só em 1931, quando atingiu a maioridade física, que o espirito de Emmanuel passou a dirigir e orientar a imensa obra da qual ele tem sido o intermediário.

Maria Eunice Luchesi e Zelinda com Chico Xavier, numa estrada da vida, nos anos 70

imageTAKO próprio Chico reconhece três períodos distintos em sua vida mediúnica. A primeira, dos 4 aos 17 anos, época em que via sua mãe e estava sob a influência de entidades felizes e infelizes; a segunda, dos 17 aos 21 anos, quando conheceu o Espiritismo e psicografou mensagens dos espíritos amigos e que foram inutilizadas, a pedido deles, por se tratarem de esboços e exercícios de adestramento, e, finalmente, o terceiro período, de 1931 até os dias de hoje, que se iniciou com a presença do espírito guia Emmanuel, quando este assumiu o encargo de orientar suas atividades mediúnicas.

 

A partir de 1932, com a publicação do Parnaso de Além Túmulo, coletânea de poesias de escritores brasileiros e portugueses desencarnados, os livros psicografadas por seu intermédio começaram a ser editados pela Federação Espírita Brasileira (FEB). Foi assim com as 85 primeiras obras. As demais foram publicadas por várias outras editoras.

 

Os direitos autorais, desde o primeiro volume, foram doados a obras de benemerência, com a transferência dessa responsabilidade às editoras. Às vezes, faltava o necessário em sua casa, mas jamais recebeu um único centavo da obra dos espíritos. Chico Xavier tem diferentes tipos de mediunidade: psicofonia com transfiguração; efeitos físicos e materialização; xenoglossia ou mediunidade poliglota, desdobramento; cura etc., mas a principal delas é a psicografia.

 

Em 1958, o médium foi acometido de labirintite. Nesse mesmo período, através da imprensa, sofreu ataques de um sobrinho, que contestava suas faculdades mediúnicas e dizia inverdades sobre a conduta do tio. Foi um triste episódio para a família Xavier.

 

Em janeiro de 1959, aconselhado por seu médico, mudou-se para Uberaba, a convite de Waldo Vieira, aquela época ainda estudante de medicina, e que fundou a Comunhão Espírita Cristã com a finalidade de dar suporte às tarefas do médium e às suas próprias, uma vez que ele também era psicógrafo, tendo lançado 17 obras em parceria com Chico.

 

Em 1965 e 1966, ambos fizeram viagens ao Exterior, visitando irmãos espíritas nos Estados Unidos e na Europa, com a finalidade de difundir o Espiritismo. 0 livro The World of the Spirit, publicado pela Philosophical Library, de Nova Iorque, em 1966, e a fundação de núcleos espíritas em Washington e Ellon Collegue, foram frutos de suas atividades no Exterior. Depois da última viagem, em 1966, o Dr. Waldo Vieira desligou-se totalmente de suas tarefas espíritas e mudou-se para o Rio de Janeiro.

Família dos fundadores em 1969

imageQO1Até 19 de maio de 1975, Chico permaneceu na Comunhão Espirita Cristã, desligando-se depois dessa data, quando essa instituição foi beneficiada, em testamento, com um grande patrimônio de terras em Goiás.

 

Reiniciou suas atividades no Grupo Espírita da Prece, em casa muito simples e humilde localizada no bairro João XXIII, em Uberaba, onde permaneceu em atividades mediúnicas até o declino de suas forças físicas, depois dos 80 anos. Ainda hoje, às vésperas de completar 86 anos, recebe para os cumprimentos, em sua própria casa, as pessoas que vão em busca de consolo e instrução.

 

Além de presidir o Grupo Espirita da Prece, seu filho adotivo, Dr. Eurípedes Higino dos Reis, o tem auxiliado nas tarefas que ainda pode realizar, porque está paralítico das pernas e tem o corpo físico naturalmente debilitado. Após o enfarte que sofreu, em novembro de 1976, o perseverante seareiro vem se submetendo a tratamento constante para o problema cardíaco, obedecendo fielmente as prescrições médicas. Antes, já fazia, de forma regular, tratamento no olho esquerdo, uma vez que o perdeu totalmente por doença irreversível.

 

Sofreu várias intervenções cirúrgicas, inclusive para correção de hérnias abdominais resultantes das sevícias da infância. Pode-se constatar, que o médium não interrompeu quase nada as suas tarefas, após o enfarte. Consolando os outros, encontrou o bálsamo e a melhora para seus próprios males.

 

Essa é uma característica de sua maneira de ser. Calcula-se que nesses quase 69 anos de atividade mediúnica ininterrupta, ele tenha recebido milhares de mensagens de desencarnados aos familiares, além dos autores dos 397 livros psicografados até o momento.

 

A influência de Chico Xavier, como pessoa e como médium, tem sido muito grande no relacionamento humano em nosso país e está a merecer um estudo sociológico profundo e abrangente. Essa influência é nítida nas instituições espíritas que tem procurado atender aos marginalizados: crianças desvalidas, velhos abandonados, doentes e sofredores sem recursos.

Zelinda e Arsenio com Chico Xavier em meados dos anos 70

imageLJOA sua liderança é diferente, como afirmou o sociólogo Cândido Procópio em entrevista a médicos espíritas, na década de 70. Ela resulta da bondade e da humildade, diferentemente de tudo o que é usual na Terra. “Ele beija as mãos que beijam as suas”, reparou Procópio.

 

Na verdade, a vida de Chico Xavier reforça a obra recebida por seu intermédio. A forma heróica com que tem suportado todas as provações da vida; a humildade sincera perante o próximo, inclusive os outros lideres religiosos; o despojamento dos bens materiais; a entrega dos direitos autorais de todos os livros recebidos por seu intermédio a instituições beneficentes e a paciência evangélica com que tem atendido milhões de criaturas sofredoras, constituem os alicerces onde se assentam os ensinamentos espirituais canalizados por sua mediunidade.

 

É por isso que em pesquisa recente realizada pela revista Veja (10/1/ 96) ele é o único religioso que está entre as 20 pessoas mais lembradas pelos brasileiros — 66% — como capaz de lhes dar alegria e felicidade. Em 1981, ele foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz, com milhões de assinaturas. Não recebeu a premiação, mas tem sido alvo, no Brasil, de inequívoca manifestação de carinho e reconhecimento como autêntico homem da paz.

 

O traço marcante de Chico Xavier é o seu amor pela humanidade. Partilhamos da assertiva de Gandhi: “quando um único homem chega à plenitude do amor, neutraliza o ódio de muitos milhões”.

Chico Xavier na cerimônia de casamento dos fundadores em 03/03/1970

Ao fundo o grande humanista e amigo do casal Vicente Ourique de Carvalho

imageD45É por isso que, apesar de toda a tentativa de se anular, fugindo a qualquer posição de destaque, Chico Xavier é o líder diferente que influi, transforma e redime, tornando menos árida a vida humana, pelo poder inexplicável do amor e da humildade.

 (Fonte: livro Lições de Sabedoria – Autora: Marlene Rossi Severino)

 

Em Tempo

 

Chico Xavier, que fez tantas previsões para tanta gente, conseguiu satisfazer seu último desejo. “Quero morrer num dia em que os brasileiros estiverem alegres, para amenizar a minha perda. Não quero ir embora deixando tristeza nesse povo sofrido e sim, felicidade”.

 

Este foi o desejo que Chico Xavier expressou ao filho adotivo, Eurípedes Humberto, de 50 anos, semanas antes de morrer.

 

E ele não poderia ter escolhido um dia melhor, pois ontem, no mesmo dia de sua morte, a nação comemorou o pentacampeonato conquistado pela Seleção Brasileira.

 

Chico Xavier acordou cedo no domingo, fez as orações habituais, tomou o café da manhã e não assistiu à partida da Seleção Brasileira contra Alemanha, mas quis saber o resultado. O líder espírita passou o dia em companhia da família e de uma enfermeira, em sua casa no bairro parque das Américas. Ele foi dormir no horário de costume, às 19h20, e morreu cerca de dez minutos depois.

 

O médium mais conhecido do país morreu aos 92 anos, vítima de uma parada cardíaca. Foi encontrado em seu quarto pelo filho, Eurípedes. O médico da família, Eurípedes Tahan, foi chamado mas nada pôde fazer. “Foi uma morte a seu estilo, bem serena, ele nem chegou a sentir dor”, disse o médico.

Fonte: Jornal Último Segundo de 01 de Julho de 2002