O mais incrível e espetacular dos líderes milenares surgidos no Brasil. Milhares de homens são testemunhas disso.
Famoso no país inteiro, capaz de fazer profecias e ser considerado santo por milhares de pessoas, ele afirmava que um exército viria do mar para derrubar a recém proclamada República do Brasil.
Quando isto acontecesse, os únicos poupados seriam os habitantes do seu Território Independente de Canudos, pequeno, mas soberano e livre, em guerra com o mundo exterior.
Quem fazia estas estranhas profecias? Antônio Vicente Mendes Maciel, ou Antônio Conselheiro, nascido em 1835, em Quixeramobim, CE., o mais espetacular líder de movimentos milenares surgido no Brasil. (Os chamados movimentos milenares são os que preveem o fim do mundo e a chegada de um período de felicidade para todos, num futuro remoto).
Devido à ignorância e à falta de quem suprisse suas necessidades religiosas, os camponeses do século passado levavam muito a sério os caminhantes, monges ou frades leigos, que pregavam pelo interior. De vez em quando, um destes pregadores acabava se tornando um profeta do povo.
Foi o que aconteceu, em grandes proporções, com Conselheiro. Filho de lavradores pobres, ele trabalhou como empregado braçal até ser abandonado pela mulher. Então, tornou-se pregador.
Mesmo vivendo de esmolas, Conselheiro — apelido que ganhou por atuar muito bem em pequenas brigas ou discussões — conseguiu chamar a atenção de todos para seus hábitos acéticos e misteriosos.
Canudos – Foto da época da invasão
De vilarejo em vilarejo, seguido por outros mendigos, iniciava, rezando terços e ladainhas, uma longa vida de pregador.
Sua aparência severa e seu modo estranho de falar trouxeram-lhe, em pouco tempo, a fama de santo.
Enquanto sua vida se resumia a preces e esmolas, sua ação era considerada benéfica pelo governo e pela Igreja. E ele não foi molestado.
Em cada lugar a que chegava, Maciel acabava convencendo os ricos de que fizessem doações, e os pobres de que trabalhassem em favor da Igreja. Por que, então, iriam os padres deixar de tolerá-lo?
E se ele era inofensivo politicamente, por que a Monarquia iria se preocupar com sua existência?
Mulheres e crianças prisioneiras de Canudos
Tudo, onde quer que Conselheiro chegasse, girava em torno de suas profecias, milagres e curas, que o povo comentava credulamente.
Mas, quando foi proclamada a República, seus discursos se tornaram francamente hostis ao novo regime. E, se o fato de ter afirmado que era a encarnação do Espírito Santo não tinha sido motivo suficiente para confiná-lo num asilo, o fato de haver-se tornado um homem de oposição era muito mais perigoso. E Antônio Vicente Mendes Maciel passou a ser perseguido pela polícia.
“O mundo vai acabar em 1900” – prometia ele, e mesclava suas previsões de uma bem calculada dose de mistério, que impressionava o povo simples que o seguia.
Em conflito aberto com as autoridades, Conselheiro seguiu para o Nordeste da Bahia e fez de Canudos, vilarejo de apenas 200 habitantes, seu quartel-general.
Ali, pregando austeridade e privação, embora deixasse alguns de seus discípulos saquearem as cidades vizinhas, ele se preparava para o ataque que certamente viria.
A comunidade, entretanto, continuou religiosa e, em 1895, um capuchinho teve permissão para entrar, batizar mais de 100 crianças e fazer alguns casamentos.
Canudos era agora um Estado independente, e os ataques esperados faziam parte de um processo que culminaria com o fim do mundo.
E eles não tardaram a acontecer. O estopim foi um pequeno conflito entre os milenares e tropas do governo, em Juazeiro.
As tropas federais sofreram muitas baixas e, em seguida, em 1896, um exército de mais de quinhentos soldados atacou Canudos.
Para Conselheiro e seus homens, os ataques não eram surpresa. Aquele e um terceiro, com 1 300 soldados, foram vencidos.
As tropas do governo eram, na verdade, inexperientes: não conheciam a região e, com dificuldade, chegavam às colinas que rodeavam e protegiam o vilarejo. Essa era a grande vantagem estratégica dos seguidores de Maciel.
Canudos era, agora, um campo militar: cada homem armado tinha também a certeza de que defendia a justiça, a terra prometida — a única que sobreviveria ao fim do mundo e à destruição da República.
O governo enviou, então, 5 mil homens contra a pequena cidade. E um canhão, carregado penosamente pelos soldados até o alto das colinas, destruiu uma das tones da igreja, que fora construída com tanto amor.
Isto aconteceu em 1897, ano em que Antônio Conselheiro morreu, aparentemente de disenteria.
Sua morte, em vez de desanimar os contestadores, fez com que eles – acreditando que seu líder tivesse ido convocar a assistência dos anjos – lutassem com maior tenacidade. Porém, não há tenacidade que vença 5 mil homens. E, embora tivessem infligido aos federais mais de 2 mil baixas, duas semanas depois da morte de seu líder, os homens de Canudos acenavam a bandeira branca.
Durante a trégua, os rebeldes enviaram para fora da cidade os velhos, as mulheres e as crianças. Em seguida, retomaram a luta e resistiram até que morresse o último homem.
Antônio Maciel, ou Conselheiro, foi, sem dúvida, um fanático. E o comentário mais comum que ainda hoje se faz dele é o de que “a multidão o criou à sua imagem”.
Apesar disto, para os camponeses do século passado, ele foi a doce esperança de um mundo novo e a personificação de um sonho longínquo.
Envolvido com o cristianismo romano e hostilizando a Igreja — o que mostra sua confusão mental — defendendo a Monarquia e atacando a República que mal conhecia, Conselheiro surge aos nossos olhos como um típico produto do meio.
Louco, fanático ou visionário, ninguém pode negar que ele percebeu a necessidade do povo de acreditar em algo além de sua vida miserável e de culpar alguém por ela.
Sem dúvida, seu magnetismo pessoal era espantoso, o de um grande líder carismático. Várias décadas e milhares de pessoas foram testemunhas disto.
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